SE 210 Caravelle / Sud Aviation Caravelle I / III / VI

Assim como outros países no mundo, a França sentiu os efeitos da Grande Depressão de 1929, como desaceleração da economia e aumento do desemprego e da instabilidade social e política. Uma onda de greves e ocupações de fábricas, que começaram na indústria metalúrgica, se espalharam por diversos setores. É nesse contexto que o governo da França, liderado por Léon Blum, implementou uma série de mudanças, incluindo a nacionalização das indústrias de guerra em 1936. A crescente ameaça da Alemanha nazista levaram o governo francês a adotar medidas para fortalecer a aviação, considerada estratégica para a defesa nacional. Em 1937 foram criadas seis empresas de construção de aeronaves, denominadas "Société Nationale de Constructions Aéronautiques". As diversas empresas privadas foram nacionalizadas e agrupadas de acordo com suas localizações geográficas, formando a SNCAC (Centro), SNCAM (Meio), SNCAN (Norte), SNCAO (Oeste), SNCASO (Sudoeste) e SNCASE (Sudeste).
A Segunda Guerra Mundial teve um impacto devastador na indústria aeronáutica francesa. Após a libertação da França, em 1944, o governo francês investiu pesadamente para reconstruir rapidamente a infraestrutura necessária para retomar a construção de aeronaves no país. A SNCAC foi absorvida pela SNCAN em junho de 1949, enquanto a SNCAM foi absorvida pela SNCASE e a SNCAO foi absorvida pela SNCASO. A aviação comercial era vista pelo governo da França como um setor estratégico para reconstrução econômica após a Segunda Guerra Mundial. Nesse sentido, o governo, através do SGACC (Secretariat Général à l'Aviation Civile et Commerciale), lançou uma concorrência para um novo avião comercial em outubro de 1951. As especificações incluíam capacidade entre 55 e 65 passageiros e alcance suficiente para realizar voos dentro da Europa. Apesar de não se comprometer com uma encomenda garantida pela estatal Air France para o projeto vencedor, a SGACC tinha o objetivo de financiar o desenvolvimento da aeronave, incluindo subsídios governamentais e facilidades para companhias aéreas francesas comprarem o avião.

Nesse período a aviação comercial passava por grandes transformações, impulsionada pelos avanços tecnológicos advindos da Segunda Guerra Mundial. O Reino Unido saiu na frente, sendo o pioneiro na construção de aeronaves comerciais turboélice, com o Vickers Viscount, e jato, com o de Havilland Comet. Enquanto isso a maior fabricante de aeronaves comerciais do mundo, Douglas, acreditava que a transição dos aviões a pistão para turboélice e jato iria ser lenta, abrindo espaço para versões ainda mais eficientes do Douglas DC-7. A SNCASE já havia feito parcerias com a de Havilland anteriormente, como por exemplo o SE.535 Mistral, a versão do caça De Havilland DH100 Vampire produzida na França pela SNCASE. Como as fabricantes francesas ainda não eram capazes de produzir jatos, o governo francês promoveu uma parceria entre a SNCASE e de Havilland para reequipar a Força Aérea Francesa no pós-guerra. A SNCASE aproveitou os laços estreitos com a de Havilland para enviar à SGACC um projeto para um jato utilizando a fuselagem do de Havilland Comet e motores jato da Rolls-Royce. O projeto foi batizado de "SE 210 Caravelle", fazendo referências as duas últimas letras da fabricante (Sud-Est), o número do projeto e as caravelas portuguesas e espanholas dos séculos XV e XVI, como um símbolo de inovação e velocidade. O Caravelle foi a primeira aeronave comercial do mundo a adotar motores montados na parte traseira da fuselagem, uma configuração que iria inspirar diversos outros jatos no futuro. Em 1953 o projeto da SNCASE foi o vencedor da disputa com outras fabricantes francesas, recebendo o apoio do SGACC.

A fuselagem do Caravelle é derivada do Comet, mantendo a mesma largura e o mesmo nariz, e é feita inteiramente de liga de alumínio. As asas eram montadas na parte inferior da fuselagem, eram equipadas com grandes flaps, permitindo operações em pistas curtas, e acomodavam os tanques de combustível. Os motores na parte traseira da fuselagem trouxeram diversas vantagens para o modelo, como por exemplo o menor ruído na cabine, uma característica apreciada pelos passageiros, principalmente numa época em que os motores eram mais barulhentos. Além do menor ruído, a posição também reduzia o risco do motor engolir um objeto estranho durante a decolagem ou pouso, tornando o Caravelle adequado para operar em pistas mal preparadas. O fato de não haver motores nas asas permitiu que a altura do trem de pouso fosse menor, facilitando o embarque e desembarque, e permitia um fluxo de ar mais limpo nas asas, melhorando a eficiência aerodinâmica. Para operar em aeroportos sem infraestrutura, o Caravelle era equipado com uma escada na parte de trás d fuselagem, permitindo o embarque e desembarque dos passageiros.
O Caravelle ficou famoso pela suas elegantes curvas na fuselagem, sendo frequentemente citado na lista de aeronaves comerciais mais bonitas do mundo. As curvas do Caravelle não eram apenas estéticas, mas também funcionais, pois ajudavam a reduzir a resistência ao ar e melhoravam a eficiência do combustível.
O Caravelle foi segundo jato comercial do mundo (com voo inaugural menos de um mês antes do soviético Tupolev Tu-104) e é descrito por muitos como o primeiro jato comercial do mundo para rotas curtas e médias. Enquanto o pioneiro, Comet 1, produzido pela de Havilland, sofreu uma série de acidentes e chegou a ser proibido de voar, o Caravelle não sofreu nenhum problema, se tornando um sucesso de vendas.
Em 1956 o Caravelle iniciou uma turnê de demonstração ao redor do mundo. Na mesma época a fabricante SNCASE estava em processo de fusão com a SNCASO, formando, em março de 1957, a Sud Aviation. Dessa forma a aeronave também passou a ser conhecida como Sud Aviation Caravelle ou ainda Sud Aviation SE 210 Caravelle. As primeiras encomendas veiram da Air France e SAS, entre 1956 e 1957.

A primeira versão ficou conhecida como Caravelle I e fez o seu voo inaugural em maio de 1958, pela Air France. Em fevereiro de 1960 foi lançado o Caravelle IA, com motores mais potentes.
Em dezembro de 1959 foi lançado o
Caravelle III, com motores ainda mais potentes e maior peso máximo de decolagem. Com exceção de uma unidade (que se acidentou) todos os Caravelle I e IA foram convertidos para Caravelle III. A próxima versão foi o Caravelle VI N ("Normal"), com novos motores e maior peso máximo de decolagem, lançado em setembro de 1960.
A versão Caravelle VI R ("Reverse") foi um marco na história da aviação comercial mundial, sendo o primeiro avião comercial do mundo com reversores e spoilers (os modelos anteriores tinham pára-quedas de frenagem). As janelas da cabine do piloto ficaram maiores e com novo layout e os freios ficaram mais potentes. Ele voou pela primeira vez em 6 de fevereiro de 1961 e entrou serviço com a United, em 14 de julho.
O Caravelle VII foi uma tentativa de conseguir mais vendas no mercado americano, sendo baseado no Caravelle III, mas equipado com motores da General Electric. A única a realizar uma encomenda foi a TWA, mas esta acabou desistindo do modelo e preferiu o DC-9.
Inicialmente havia um ceticismo sobre o uso de jatos em rotas curtas, devido ao alto consumo de combustível e maiores custos operacionais. Mas o Caravelle mostrou que era possível lucrar com um jato de médio alcance e os passageiros preferiam jatos porque eram mais rápidos. O fato de ter sido o primeiro e não ter concorrentes também contribuiu para impulsionar as vendas do modelo nos primeiros anos. O Caravelle também podia operar em pistas mais curtas do que os grandes jatos intercontinentais, como o Boeing 707, tornando-o ideal para aeroportos menores. A aeronave também recebeu forte apoio do governo francês, que o promovia como um símbolo da aviação francesa e oferecia financiamentos atrativos para as companhias aéreas interessadas em adquirir o modelo. No entanto a medida que novos concorrentes foram surgindo, as vendas começaram a declinar. A Sud Aviation então começou a estudar o lançamento de versões maiores do Caravelle para tentar reverter a situação.
No Brasil o Caravelle inaugurou a era do jato pela Varig em 1959. Posteriormente a Cruzeiro e a Panair também adquiriram a aeronave para voos domésticos e para a América do Sul. Apesar de famoso pela sua beleza, o Caravelle não teve uma carreira longa no Brasil. A Varig os substituiu em pouco tempo, enquanto a Panair os operou por cerca de três anos. A maior operadora do tipo foi a Cruzeiro, que sem recursos para substituir a aeronave, permaneceu operando o Caravelle até 1975, quando foi adquirida pela Varig.

Operadoras no Brasil: Cruzeiro, Panair do Brasil, Varig


Günter Grondstein

 

Modelo:

Construídos: Acidentes:

Caravelle I

20

Caravelle IA

12  

Carevelle III

106 23

Caravelle VI

112 26
     

Origem: França
Produzido: 1958-1966
Comprimento: 32,01 m
Envergadura:
34,30 m
Altura:
8,72 m
Peso: 27,2 toneladas / 35,5 toneladas (VI)
Peso máximo de decolagem/pouso: 48/43,8 toneladas

Capacidade de combustível: 19 mil litros
Motores:
I: 2
x Rolls-Royce RA-29 Mk 522
III: 2x Rolls-Royce RA-29 Mk 527
VI: 2x Rolls-Royce RA-29 Mk 531 ou 533
Empuxo: 9-11 (2x 4-5) tonf
Velocidade de cruzeiro: 725 km/h
Velocidade máxima:
805 km/h
Altitude de cruzeiro: 10,6 km
(35 mil ft)
Pista mínima para decolagem: 1,8 km
Passageiros: 64 a 80
Primeiro voo: 27 de maio de 1955
Concorrentes: BAC 1-11,
Boeing 737-100, DC-9-10, Tupolev Tu-134
Alcance:
1700 km / 2350 km (VI)
Companhia lançadora: Air France
Comparar com outras aeronaves

 

 

 

Sud Aviation Caravelle 10 / 11 / 12

Com a crescente competição do Boeing 737 e DC-9, a Sud Aviation começou a estudar versões maiores. As aeronaves da Boeing e Douglas utilizavam motores mais eficientes e tinham maior capacidade de passageiros, oferecendo um custo por passageiro menor. Em 1962 a Sud Aviation lançou a Série 10, uma versão alongada, capaz de transportar mais de 100 passageiros. Essa versão foi a primeira a utilizar motores turbofan e também introduziu o LEX (Leading Edge Extension), uma extensão da borda de ataque da asa, projetada para melhorar a aerodinâmica e o controle da aeronave, especialmente em ângulos de ataque elevados. Uma superfície adicional se estende à frente da asa, ajudando a direcionar o fluxo de ar sobre a asa de forma mais eficiente, gerando vórtices que aumentam a sustentação e atrasam o estol. Essa versão era composta pelas subvariantes: Caravelle 10A, equipado com motores General Electric, essa versão não recebeu nenhuma encomenda, Caravelle 10B, equipada com motores Pratt & Whitney JT8D (o mesmo do B737 e DC-9), e Caravelle 10R, que utilizava a mesma fuselagem do Caravelle VI-R e os motores JT8D. O primeiro voo comercial da Séries 10 foi em agosto de 1964, pela Finnair.
Em 1967 foi lançada uma versão alongada do Caravelle 10R, o Caravelle 11R, permitindo-o transportar mais carga e passageiros.
A última versão foi lançada em março de 1971, o Caravelle 12. Com novos motores e fuselagem mais comprida que o Caravelle 10, essa versão era capaz de levar mais passageiros. O Caravelle 12 tinha o mesmo apelido do projeto inicial da Sud Aviation para um avião supersônico (Super Caravelle), que deu origem ao Concorde.
Apesar de tentar atualizar o Caravelle, o modelo continuou sofrendo forte competição de concorrentes como o Boeing 737 e DC-9, fazendo com que os sucessores Caravelle 10, Caravelle 11 e Caravelle 12 obtivessem consideravelmente menos vendas. Com vendas cada vez menores, a Sud Aviation abandonou o projeto de novas versões do Caravelle em prol de um novo avião comercial supersônico, que mais tarde se tornaria o Concorde.
Em 1970 a Sud Aviation fundiu-se com a Nord Aviation, formando a Aérospatiale.

 


Günter Grondstein

 

Modelo:

Construídos: Acidentes:

Carevelle 10

43 11

Caravelle 11

6 4

Caravelle 12

12 0
     

Origem: França
Produzido: 1964-1972
Comprimento:
32,71 m (11) / 33,01 m (10) / 36,24 m (10B/12)
Envergadura:
34,30 m
Altura:
8,72 m
Peso: 29 toneladas / 31 toneladas (12)
Peso máximo de decolagem: 54 ton / 58 ton (12)
Peso máximo de pouso: 49,5 toneladas
Motores: 2x P&W JT8D-7 ou P&W JT8D-9 (12)
Empuxo: 12-13 (2x 6) tonf
Velocidade de cruzeiro: 750 km/h
Velocidade de máxima: 825 km/h
Altitude de cruzeiro: 10,6 km (35 mil ft)
Pista mínima para decolagem: 1,9 km / 2,4 km (12)
Passageiros:
10R: 80
10B: 105
11: 89 a 99
12: 140
Primeiro voo: 3 de março de 1964
Concorrentes: DC-9-30/40, Boeing 737-200
, BAC 1-11-500
Alcance: 2900 km / 2540 km (12)
Comparar com outras aeronaves

 

 

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