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Long Range: voando longe

Na aviação, três critérios são sempre seriamente considerados ao se analisar uma aeronave: velocidade, capacidade e alcance. São os três mais importantes parâmetros na operação de qualquer aeronave: quão rápido voa, quanto é capaz de carregar e quão longe voa.

Se nas primeiras décadas da aviação a velocidade evoluiu vertiginosamente, partindo de uma centena de quilometros por hora para quase 800 com o advento do Comet 1 em 1952, a velocidade chegaria em 1958 num patamar de onde cresceria muito pouco nas décadas seguintes - ficando estacionada ao redor de 900 km/h, com a entrada em serviço do Boeing 707. Isso, claro, desconsiderando os supersônicos Concorde e o Tupolev 144.

Quando falamos de capacidade, pensamos no crescimento que vai dos 30 assentos comumente encontrados no DC-3 - base para nossas comparações, até por ser o primeiro sucesso mundial da indústria comercial - o crescimento foi constante até 1989, quando a versão 747-400D do Boeing 747, de uso exclusivo no mercado doméstico japonês, chegou na casa dos 580 lugares.

Essa capacidade de mais de 500 assentos será em breve o padrão dos novos gigantes dos ares, os Airbus A380-800, que transportarão 555 passageiros em 3 classes. Se na velocidade e na capacidade chegamos em limites que deverão ser mantidos por um bom tempo, vamos nos concentrar no alcance, comumente confundido com autonomia. Alcance define a distância percorrida pela aeronave. Autonomia define a capacidade de permanência em vôo usando outra régua, o tempo. Por falar em tempo, chegou a hora de fazer uma viagem ao passado e conhecer os aviões que mais longe voaram nos últimos 50 anos.

Strats, Connies e Starliners

Antes da Segunda Guerra, as grandes travessias oceânicas eram feitas em hidroaviões quadrimotores como os Shorts ingleses ou os norte-americanos Sikorski S-42, Martin M-130 e Boeing 314. Com o fim do conflito, os hidroaviões foram substituídos pelos grandes quadrimotores a pistão baeados em terra. Dois tipos desenvolvidos na primeira metade dos anos 40 surgiriam como os de maior alcance logo após o final da Guerra: o Douglas DC-4 e o Lockheed L-749 Constellation, embora o alcance desses pioneiros ainda não permitisse vôos transoceânicos sem escalas.

Um derivado do famoso B-29 viria a ser o primeiro desenhado para vôos longos no período do pós-guerra. O Boeing 377 Stratocruiser, primeiro avião terrestre capaz de cruzar o Pacífico. O Stratocruiser foi operado no Brasil pela Pan American, que chamava de "Presidente" seus serviços sul-americanos. Com dois andares, transportava em média 81 passageiros e tinha 7,400 km de alcance, um gigante para a época. Apenas 54 foram construídos, mas os "Strats" iniciaram serviços históricos, como as primeiras ligações entre Londres e New York sem escalas. Seu reinado não duraria muito: os fabricantes lançaram novos modelos específicos para vôos ultra longos ainda já na década de 50. Em 1954, entraram em serviço os Douglas DC-7C e o Lockheed Constellation L-1049G, os mais avançados modelos de quadrimotores desenvolvidos então.

Ambos foram operados no Brasil pelas maiores empresas na época. O DC-7C, conhecido como Seven Seas, foi escolhido pela Panair, que utlizou o modelo em suas rotas para a Europa e Oriente Médio, fazendo esaclas em Recife antes de atravessar o Atlântico Sul. A Varig já em 1955 colocou seus L-1049G em serviço para New York, com escalas. Com todo respeito aos DC-7, os Constellation foram mesmo os mais belos, elegantes e emblemáticos aviões de seu tempo, além de serem, inquestionavelmente, os que mais longe voavam. Os modelos G e H, este usado pela Real Aerovias nas suas rotas para o Japão, voavam nada menos que 7,757 km sem escalas.

Esse número subiu para 9,800 km com a entrada em serviço em maio de 1957 do L-1649G Starliner, o desenvolvimento final da família, capaz de voar por 24 horas. Nas asas da TWA, inaugurou vôos transpolares sem escalas entre a Europa e a Costa Oeste dos Estados Unidos. Mas como voava a 520 km/h, essas travessias levavam 20 horas ou mais, dependendo dos ventos. O recorde de vôo mais longo regular sem escalas, (em duração) prova bem isso: foi um Londres-Los Angeles em 1958, que durou exatamente 23h19!

Se eram vôos longos, pelo menos os 68 passageiros a bordo contavam com acomodações confortabilíssimas, pois até cabines privativas com camas eram padrão dentro dos Starliners da Lufthansa, Air France e TWA, principais operadoras do tipo.

Os clássicos quadrijatos intercontinentais

Em outubro de 1958, os Comet 4 da BOAC, e os Boeing 707-121 da Pan American estabeleceram definitivamente a era do jato, após o trágico começo dos Comet entre 1952 e 1954, marcados por uma série de acidentes e pela suspensão das operações com o tipo. Se a aviação aumentava sua velocidade, ainda não conseguia superar a barreia dos 10,000 km de alcance, que só seria superada por dois jatos famosos: o Boeing 707 e o Douglas DC-8, em versões mais avançadas, surgidas já na década de 60.

O 707-320 e o DC-8-62 foram os primeiros jatos realmente intercontinentais, fundamentais para a abertura de rotas que hoje consideramos normais. Rio-Frankfurt sem escalas? Muitas empresas devem anos de crescimento vertiginoso de tráfego e de lucros aos inesquecíveis 707 e DC-8. A Varig é uma delas. Foi nas asas do 707 que a empresa criou seus primeiros seviços intercontinentais non-stop. O primeiro foi Rio-New York (7,703 km) ainda em 1960. Depois, vôos famosos como Rio-Roma (9,152 km) e Rio-Paris (9,126 km), ambos herdados da Panair.

Outros exemplos: a Qantas em 1965 foi a primeira a atravessar sem escalas o Oceano Pacífico, voando os 11,936 km entre Sydney e San Francisco num 707-320B. Em 1968 a Varig usou as longas pernas do 707 e foi parar do outro lado do mundo, com apenas uma escala. A gaúcha passou a operar em 26 de junho o serviço Rio - Los Angeles (10,129 km ) e Los Angeles -Tokyo (8,832 km), mostrando toda a capacidade do 707.

Note que a circunferência da Terra é de 40,000 km, duas cidades antípodas estão distantes 20,000 km. Logo, essa é a grande meta dos fabricantes e operadores: construir e operar economicamente aeronaves capazes de voar 20,000 km. Não faltaria muito.

 

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