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EMBRAER
A quarta maior fabricante de aeronaves do mundo é
brasileira, sim senhor. Nossa Embraer, prestes a
completar 35 anos, é um exemplo de visão, perseverança,
coragem e paixão. Essa árdua jornada, excepcionalmente
curta em face dos avanços conquistados, não foi livre de
percalços. Dificuldades de todos os gêneros, contudo,
foram vencidas com um espírito desbravador, destemido,
verdadeiramente... Bandeirante. Essa saga de lutas e
fantásticas realizações finalmente é trazida para o
Jetsite.
CTA: a semente é plantada
O desenvolvimento de uma indústria aeronáutica
verdadeiramente brasileira aconteceu no longínquo ano de
1945, por atuação direta do Ministério da Aeronáutica.
Naquele ano foi criado o Centro Tecnológico de
Aeronáutica (CTA) e sua escola de engenharia, o
Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), baseados em
São José dos Campos, quase a meio caminho entre as duas
maiores cidades e mercados do Brasil, São Paulo e Rio de
Janeiro. Com planejamento tipicamente militar, os dois
órgãos seriam respectivamente o construtor de aeronaves
e o construtor dos profissionais por detrás delas: o ITA
nascia com a missão de formar a base de talentos sobre a
qual o CTA iria se capacitar para vôos mais altos.
Outro passo importante foi a criação, 1954, do Instituto
de Pesquisa e Desenvolvimento (IPD), subordinado ao CTA,
que seria responsável por desenvolver projetos e
experimentos no campo da aeronáutica. As próximas
décadas seriam dedicadas a projetos sem expressão
comercial, mas que foram importantes para afiar os
profissionais e os processos. Idéias com o um
convertiplano, um projeto bastante avançado para a
época, ou o helicóptero Beija-Flor, serviram de
laboratório de ensaios para o que a indústria
aeroespacial brasileira um dia viria a ser.
Nasce o Bandeirante
Com o golpe militar em 1964, Governo e nossas Forças
Armadas se tornaram uma entidade só. E com esse respaldo
político de peso, um grupo de técnicos civis e
militares, liderados pelo então major-aviador Ozires
Silva, começou a trabalhar no desenvolvimento de um
bimotor turbohélice. O ano era 1965, e a missão dessa
nova aeronave de oito lugares era realizar transporte
leve para a Força Aérea Brasileira.
Esse grupo, formado em sua maioria por engenheiros
aeronáuticos formados pelo ITA, era liderado por um
estrangeiro, o francês Max Holste, criador do Nord 262.
Sua breve passagem no Brasil foi decisiva para acessorar
a equipe que desenvolvia o novo avião, designado
provisoriamente de IPD/PAR 6504: era um monoplano de asa
baixa, totalmente metálico, provido de um trem de pouso
triciclo retrátil, dois motores Pratt & Whitney Canada
PT-6A e peso máximo de decolagem de 4.500 kg.
A construção de dois protótipos foi iniciada em 1966.
Foram três anos de muito trabalho e de problemas
aparentemente insuperáveis, mas prevaleceu a garra à
inexperiência, a vontade de ferro ao desconhecimento.
Afinal, a pátria de Santos Dumont precisava mesmo ter
sua própria indústria aeroespacial.
Na manhã de 22 de outubro de 1968, o valente avião
decoou pela primeira vez. Os céus ganhavam um
Bandeirante pilotado pelo major Mariotto Ferreira e pelo
engenheiro Michel Cury, que mais tarde viria a ser
diretor comercial da Embraer. O vôo deu o impulso que
faltava para o abnegado time. Em última análise, foi
nesse dia que, ao meno no espírito desses homens, nasceu
a Embraer. Mas se o grupo estava empolgado, o mesmo não
podia ser dito dos empresários de nossa aviação e da
cadeia de fornecedores necessários para produzir o
avião. A idéia de uma indústria aeroespacial brasileira
era por demais avançada, mesmo nos "anos ufanos" da
década de 70. Os esforços de Ozires e equipe para
convencer os industriais brasileiros não obtinham
sucesso. Sem desanimar, Ozires finalmente conseguiu
encontrar a saída.
Nasce a Embraer
O plano de Ozires era simples e lógico: seria criada uma
empresa de capital misto, com aportes do governo, que
colocaria 10 milhões de dólares e manteria o controle
acionário com 51% das ações. O restante seria investido
pela iniciativa privada, através de um programa de
incentivo fiscal que permitia às empresas interessadas
deduzir 1% do imposto de renda devido à União para
investir em ações da nova companhia. Em 19 de agosto de
1969, o decreto-lei nº 770 criava a Embraer - Empresa
Brasileira de Aeronáutica, nome sugerido pelo engenheiro
Antônio Garcia da Silveira.
A Embraer passou a ocupar um terreno de 2,5 milhões de
metros quadrados, próximo ao aeroporto de São José dos
Campos. Na prática, a Embraer começou a operar em
janeiro de 1970, tendo como efetivo um grupo de 150
profissionais contratados dentre as cerca de 300 pessoas
que faziam parte da equipe que havia projetado o
Bandeirante no CTA. Entre eles, é claro, o próprio
Ozires Silva, diretor-superintendente da nova empresa.
Muitos outros que hoje ocupam cargos de diretores ou
gerentes na Embraer, também pertenciam àquele grupo. Uma
ausência foi a do francês Max Holste, que mudou-se para
o Uruguai pois não acreditava que aquela equipe pudesse
colocar um único Bandeirante em produção. Holste só
errou por 500 unidades.
O Ministério da Aeronáutica fez sua parte, ao encomendar
80 Bandeirante e 112 jatos de treinamento MB-326, que
seriam fabricados sob licença da italiana Aermacchi, e
conhecidos por EMB-326GB Xavante. Além disso, o
Ministério da Aeronáutica decidiu também transferir dois
programas em andamento para a Embraer. O primeiro deles
era um planador de alto desempenho, o Urupema, cujo o
primeiro vôo havia sido realizado em janeiro de 1968. O
outro, um avião agrícola, o Ipanema, que estava sendo
desenvolvido com verbas fornecidas pelo Ministério da
Agricultura. Esses programas garantiriam a sobrevivência
da companhia por alguns anos, até que ela tivesse
capacidade de voar com as próprias asas.
Começa a produção
Mais difícil que desenhar um avião é desenhar a fábrica
que vai produzí-lo. Consequentemente, foram necessários
dois anos, contados desde o final de 1969, para
organizar, construir e equipar a fábrica de São José dos
Campos, período também necessário para recrutar e
treinar pessoal adicional.
Finalmente, o primeiro aparelho fabricado foi entregue
pela Embraer: um planador EMB-400 Urupema, uma das 10
unidades produzidas entre 1971/ 1972 e entregues a
aeroclubes selecionados pelo Departamento de Aviação
Civil (DAC), que os havia encomendado.
O próximo aparelho a sair da linha de produção da
empresa foi o avião agrícola EMB-200 Ipanema, sendo o
primeiro entregue em janeiro de 1972. Sua fabricação
seria transferida para Indústria Aeronáutica Neiva em
março de 1980, após a companhia haver sido absorvida
pela Embraer. Mais de 1.000 aeronaves Ipanema já foram
entregues e a nova versão, o EMB-202 Ipanemão, continua
sendo produzido Embora a maior parte tenha sido vendida
no mercado interno, algumas foram exportadas para o
Uruguai e a Bolívia .
O Xavante foi o terceiro modelo entrar em produção na
Embraer. Desenvolvido no fim da década de 50 para Força
Aérea Italiana, ele entrou em serviço em 1962 e já havia
sido exportado e também produzido sob licença em outros
países, como a Austrália e África do Sul, antes de ser
adotado pela FAB. A entrega formal dos dois primeiros
exemplares à FAB foi em setembro de 1972. As linhas de
produção do modelo ficaram abertas por 11 anos,
fabricando nada menos que 182 aviões, sendo 166 para a
FAB, 6 ao Togo, 10 ao Paraguai e 11 à Argentina.
Acordos internacionais: crescendo e aprendendo
A Embraer crescia não somente com projetos próprios mas
colocando seu potencial para trabalhar para outros
parceiros. Sem falar na transferência de tecnologia e
know-how, a medida trouxe importantes divisas na hora em
que a empresa mais precisava delas. Afinal, até então,
eram anos de altos investimentos com baixo retorno. O
primeiro contrato foi em 1973, um acordo firmado entre a
Embraer e a Northrop Aircraft Corp., dos Estados Unidos,
para a produção de componentes para o programa de caça
supersônico F-5E Tiger II.
Em agosto de 1974, um outro acordo de cooperação foi
assinado, desta vez com a Piper Aircraft. Mas agora, ao
invés de fabricar componentes, a empresa iria produzir
sob licença aeronaves completas, uma extensa linha de
monomotores e bimotores a pistão para atender ao mercado
interno. Eram os modelos P A-28-181 Cherokee Archer (EMB-712
Tupi) e os bimotores PA-34-220T Seneca III (EMB-810D
Seneca III, um dos modelos de maior sucesso no país, com
mais de 800 unidades já comercializadas) e PA -31-350
Navajo Chieftain (EMB-820C Navajo).
Esse programa, inicialmente de responsabilidade da
Embraer, foi transferido em março de 1980 à Neiva, que
desde então passou a ser a responsável pela produção dos
modelos Piper como também do avião agrícola EMB-202
Ipanema, em suas instalações em Botucatu, interior do
esatdo de São Paulo.
Bandeirante começa a trabalhar
Ao final de 1971, ia de vento em popa a fabricação das
peças e componentes para o Bandeirante, que já havia
sido reprojetado para facilitar a produção seriada. O
projeto foi submetido a uma melhoria aerodinâmica geral,
que não apenas aumentou seu desempenho, como tornou a
aeronave esteticamente mais atraente. O vôo inaugural
desse novo Bandeirante foi em 9 de agosto de 1972.
Designado EMB-110 ou C-95 na versão militar, apresentava
novo pára-brisa, novas naceles dos motores (mais
aerodinâmicas), que acomodavam por completo o trem de
pouso principal, que de retrátil passava a ser
escamoteável, além de uma fuselagem ligeiramente
alongada capaz de acomodar até doze passageiros. Em
dezembro do mesmo ano o CTA entregava à Embraer a
homologação do aparelho e, em fevereiro de 1973, os três
primeiros exemplares de série (C-95 2132, 2133 e 2134)
eram entregues à FAB.
No Mercado civil, em fevereiro de 1973, finalmente uma
aeronave foi comercializada. O sempre visionário e audaz
empresário Omar Fontana colocou uma encomenda de 6
unidades para a sua Transbrasil. Ao assinar os papéis, A
Transbrasil tornou-se a primeira de muitas companhias
aéreas no país e no exterior a encomendar uma aeronave
100% projetada e construída no Brasil. Isso só se tornou
possível porque a FAB concordou em adiar o recebimento
de parte dos aviões que havia encomendado, abrindo
espaço na linha de produção para atender os pedidos do
mercado civil. Os Bandeirante entregues à Transbrasil
eram todos da versão E M B-110C, basicamente similares
aos recebidos pela FAB, exceto por poderem transportar
15 passageiros em vez de apenas 11. O primeiro vôo
comercial de um Bandeirante da Transbrasil ocorreu em 16
de abril de 1973. Foi um marco na história da aviação
comercial brasileira: pela primeira vez um avião
projetado e fabricado no país voava regularmente numa
companhia aérea brasileira.
Em 4 de novembro de 1973, a Vasp seguia os passos da
Transbrasil e tornava-se a segunda empresa aérea
brasileira a colocar em serviço o Bandeirante. A
primeira unidade de 10 encomendadas entrou em serviço na
Vasp, na data dos 40 anos de sua fundação.
Dois anos depois, uma portaria do DAC daria o empurrão
definitivo para o Bandeirante no mercado interno: em
novembro de 1975, foi criado o Sistema Integrado de
Transporte Aéreo Regional (SITAR), que "recomendava" a
utilização da aeronave nacional nas linhas regionais de
alimentação. O modelo então foi comprado por todas as
regionais, sem exceção.
Com o advento da era do jato no Brasil, no início dos
anos 60, e como resultado do maior custo operacional
desses aparelhos, da inexistência da infra-estrutura
adequada para a operação, além de baixa demanda, boa
parte das cerca de 400 localidades no interior do país
anteriormente servidas pela aviação regular foram
deixadas sem nenhum serviço aéreo. O sistema SITAR foi
criado exatamente para suprir a demanda de transporte
aéreo nessas localidades.
O SITAR dividia o país em cinco regiões distintas,
servidas por empresas aéreas regionais especificamente
formadas: a Votec, (centro-oeste); Rio-Sul (sul); a TAM
Transportes Aéreos Regionais, empresa resultante da
associação Táxi Aéreo Marília com a Vasp, que lhe
transferiu seus aviões Bandeirante (centro-sul); a
Nordeste Linhas Aéreas Regionais, resultado de fusão da
Transbrasil e do Governo do Estado da Bahia (nordeste);
e finalmente a TABA, Transportes Aéreos da Bacia
Amazônica, (região norte). Nos anos que seguiram a
criação do SITAR, as empresas que operam o sistema
adquiriram nada menos que 53 Bandeirante.
A popularidade do Bandeirante atravessou fronteiras e
fez com ele permanecesse em produção contínua por
praticamente dezoito anos, durante os quais foram
fabricados e entregues 500 exemplares a clientes civis e
militares em 36 países. .
Várias novas versões foram desenvolvidas tanto para os
mercados civis como para os militares. Neste último,
talvez o mais notável seja o EMB-111 "Bandeirulha",
desenvolvido para patrulhamento e ataque marítimo e
ainda em uso pela FAB. .
O Bandeirante acabou se transformando numa das aeronaves
mais vendidas na sua categoria, além de ter sido um dos
que mais contribuiu no desenvolvimento do transporte
aéreo regional no mundo. O Bandeirante foi o avião que
colocou a Embraer no cenário mundial de aviação e fez
dela uma empresa de renome internacional. O fim de sua
produção marcou também o fim de um ciclo para Embraer.
Xingú, o primeiro pressurizado
Em meados dos anos 70, a Embraer começou a desenvolver
estudos de aeronaves cada vez mais sofisticadas, pois
sabia que, embora o Bandeirante fosse um excelente
avião, precisaria de um sucessor.
Estudos para aeronaves maiores, como o quadrimotor
regional de asa alta Tapajós, ocupavam boa parte das
pranchetas. Mas quem acabou saindo das plantas para os
hangares foi uma aeronave menor até que o Bandeirante, o
primeiro avião pressurizado da companhia, batizado de
EMB-121 Xingu, cujo o primeiro protótipo realizou seu
vôo inaugural em 22 de outubro de 1975.
O Xingu acomoda confortavelmente de 6 a 8 passageiros.
Equipado com dois motores Pratt & Whitney Canadá
PT-6A-28 de 680 shp, foi homologado em 1979 e logo
depois entrou em produção seriada. Vendidos ao mercado
civil e à FAB, os Xingú acabaram tendo na França seu
maior mercado: a Força Aérea e a Marinha francesa,
adquiriram 43 exemplares a partir de 1981 para
utilização em missões de ligação e de treinamento
multimotor.
Uma versão melhorada, conhecida como EMB-121 A1 Xingu
II, foi lançada em 1982 e incluía interior reprojetado,
motores mais possantes e hélices quadripás. O Xingu
permaneceu em produção por 8 anos e no total foram
fabricados 106 aparelhos. Desse total, 55 deles foram
vendidos no mercado interno e o restante, exportados
para a Bélgica, Colômbia, França, Inglaterra e Nigéria.
Treinador puro-sangue
Se no mercado civil a empresa estudava um sucessor para
o Bandeirante, no mercado de defesa, a agitação não era
menor. Atendendo a um pedido do Ministério da
Aeronáutica, no final da década de 70 a Embraer começou
o desenvolvimento o seu primeiro avião militar de
projeto próprio, um treinador turbo-hélice de alto
desempenho. O projeto evoluiu para um monoplano de asa
baixa totalmente metálico, com trem de pouso retrátil,
totalmente acrobático, com assentos ejetáveis em tandem
e desempenho e manobrabilidade similares aos jatos. Com
velocidade máxima de 448 km/h, poderia levar
externamente até 1000 kg de armamentos diversos.
O contrato de desenvolvimento do novo treinador foi
assinado com o Ministério da Aeronáutica em dezembro de
1978 e já em 16 de dezembro de 1980 o primeiro de dois
protótipos fez seu primeiro vôo. A produção em série do
programa, sob designação militar de T-27, começou em
1982 para atender uma encomenda da FAB para 118
aparelhos. As entrega começaram em setembro de 1983,
quando os seis primeiros Tucanos foram oficialmente
entregues ao Esquadrão de Demonstração Aérea (EDA), a
famosa Esquadrilha da Fumaça.
Outro grande contrato foi anunciado em março de 1985,
quando o Ministério da Defesa da Grã-Bretanha declarou a
equipe Embraer/Shorts vencedora da acirrada concorrência
internacional para fornecer 130 aparelhos de
treinamento, com opção para mais quinze, à Royal Air
Force (RAF).
O modelo adotado pela RAF, designado Tucano T.Mk.I,
seria produzido nas instalações da Shorts Brothers em
Belfast, na Irlanda do Norte, através de um acordo de
licenciamento. Com várias modificações em relação ao
Tucano padrão, (motor Garrett de 1.100 SHP, hélice
quadripá, freio aerodinâmico e conopy bipartido) o
protótipo voou em São José dos Campos pela primeira vez
em fevereiro de 1986. Os primeiros 25 aparelhos dessa
encomenda foram produzidos pela Embraer e os demais pela
Shorts.
Outros compradores do Tucano foram a Colômbia, Quênia,
Kuwait, Paraguai, Peru, Venezuela e França. Em suas
diferentes versões, o Tucano é o treinador turboélice
mais vendido do mundo. O aparelho tem mais de 650
unidades comercializadas e 570 em operação em 14 forças
aéreas.
O sucessor do Bandeirante
Ao final da década de 70, a empresa começou a
desenvolver um bimotor turbohélice pressurizado para
substituir e complementar o trabalho do Bandeirante para
as empresas de transporte aéreo regional. Com a
experiência ganha com o próprio Bandeirante e em seguida
com o Xingu, a Embraer lançou o EMB-120 Brasilia.
Utilizando a seção de nariz e a mesma empenagem em "T"
do Xingu, tem capacidade para 30 passageiros, velocidade
de cruzeiro de 583 km/h e com seu peso máximo de
decolagem de 11.500 kg , mostrou ser uma das aeronaves
mais econômicas na categoria de 30 a 40 assentos. Tendo
feito seu primeiro vôo em 27 de junho de 1983, o
Brasília entrou em produção no final de 1984 e sua
homologação ocorreu em maio de 1985, após ter sido
completada uma campanha de 23 meses de ensaios. A
primeira entrega foi para a norte-americana Atlantic
Southeast Airlines (ASA) em agosto de 1985 e sua entrada
em serviço em outubro seguinte.
Este fato representou mais um marco na história da
Embraer: o Brasília já debutava na sua carreira voando
diretamente no exterior, o que já comprovava a confiança
dos mercados internacionais nos produtos da Embraer.
Somente mais tarde é que o Brasília iria entrar em
serviço no Brasil, através de uma encomenda da Rio-Sul,
em fevereiro de 1988.
O projeto foi sendo aperfeiçoado, incorporando melhorias
como novas turbinas PW118 (de 1.800 shp), maior
capacidade de combustível e refinamentos nos aviônicos.
Surgiram novas versões como o EMB-120 Cargo, para
transporte de até 4 toneladas de carga, o -QC (Quick
Change), versão conversível para o transporte de
passageiros ou 3,5 t de carga. Este foi foi colocado em
operação pela Total Linhas Aéreas e depois foi escolhido
pela Interbrasil Star. No total, foram produzidas 350
aeronaves de todos os modelos, e embora a linha não
esteja oficialmente encerrada, a sua fabricação agora só
acontece sob encomenda.
Um jato de ataque para a FAB
Em meados dos anos 70, a Embraer estudou junto à sua
tradicional parceira Aermacchi o desenvolvimento de um
jato de ataque para a FAB, tentativamente chamado de AX,
baseado no projeto do Xavante. Ao mesmo tempo, na
Itália, a Aeronáutica Militare desejava substituir seus
velhos Fiat G-91 e Lockheed F-104 Starfighter. Coube à
Aeritalia, braço aeronáutico do Grupo Fiat, em
associação com a Aermacchi, desenvolver uma nova
aeronave, designada AMX.
Após analisar as especificações do AX e compará-las ao
proposto AMX, o Ministério da Aeronáutica decidiu em
1980, optar pela nova aeronave, que além de mais
moderna, daria acesso a tecnologia de ponta empregada no
programa. Essa decisão levou à assinatura de um acordo
binacional e à entrada da Embraer, em julho de 1981 no
programa AMX.
O trabalho foi dividido entre as três empresas
participantes: a Alenia (ex-Aeritalia), como contratada
principal, ficou com 46%, a Aermacchi com 24% e a
Embraer com 30%. Coube à Embraer projetar, desenvolver,
fabricar e testar as asas, as entradas de ar do motor,
os pilones de armamentos, os tanques de combustível
alijáveis, o trem de pouso principal, e parte do sistema
elétrico. Propulsionado por um Rolls Royce Spey de 5.000
kg de empuxo, o AMX voa a altas velocidades subsônicas e
pode transportar até 3.800kg de armamentos. Está
equipado com mísseis ar-ar nas pontas das asas, além de
possuir dois canhões DEF 554 de 30mm.
Foram construídos 7 protótipos do AMX, 5 na Itália e 2
no Brasil. O primeiro protótipo brasileiro realizou seu
vôo inaugural em 16 de outubro de 1985 e foi apresentado
oficialmente às autoridades ítalo-brasileiras,
convidados e imprensa no dia 22 do mesmo mês.
A produção do aparelho na Embraer foi iniciada em 1987 e
o primeiro exemplar destinado à FAB, com o registro
militar A-1 5500, fez seu primeiro vôo em 12 de agosto
de 1989. Esse avião foi entregue em outubro do mesmo ano
ao 1º Esquadrão do 16° Grupo de Aviação, sediado em
Santa Cruz, Rio de Janeiro, unidade especialmente criada
para operar o AMX. O primeiro AMX biposto fabricado no
Brasil, matriculado A-1 5650, voou pela primeira vez em
14 de agosto de 1991 e foi entregue ao 1°/16ºGav em maio
do ano seguinte.
CBA-123: precursor do Mercosul
O programa seguinte da Embraer foi EMB-123, que nasceu
nas pranchetas dos projetistas da empresa em 1985.
Naquela época, os governos do Brasil e da Argentina
mantinham conversações destinadas a fomentar o
intercâmbio cultural, comercial, industrial e
tecnológico entre os dois países. Isso resultou na
assinatura, no início de 1986, de um acordo de
cooperação entre a Embraer e a FMA - Fábrica Militar de
Aviones, sediada em Córdoba, visando desenvolver e
fabricar o novo avião. Para refletir a natureza
binacional do programa, o EMB-123 foi designado CBA-123
(Cooperação Brasil Argentina).
Sob os termos do acordo, os custos totais do programa
(US$ 300 milhões) e a carga de trabalho foram divididos,
com 2/3 para a Embraer e 1/3 para FMA. Ficou acertado
também que seriam estabelecidas duas linhas de montagem
independentes, uma em São José dos Campos e outra em
Córdoba .
Se no plano político tudo corria bem, no campo da
engenharia o projeto começou a andar de lado. O CBA-123
pretendia ser um avião revolucionário tanto em
desempenho quanto em configuração, usando dois motores
Garret TPF-351-20 em configuração "pusher". Isso
permitiria a adoção de uma asa limpa e aerodinamicamente
mais eficiente, de perfil supercrítico. O aparelho
utilizava uma fuselagem do Brasília encurtada, era
provido de um sistema FADEC (Full Authority Digita
Engine Control), cabine de pilotagem totalmente digital,
equipada com siatema EFIS (Eletronic Flight
Instrumentation System) e EICAS (Engine Indication and
Crew Alerting System), que monitora cerca de 500 itens
associados aos sistemas do avião, permitindo fácil
identificação e retificação de panes.
Adicionalmente, o CBA-123 seria o primeiro avião no
mundo na sua faixa de assentos a ser projetado desde o
começo para ser homologado dentro das normas FAR 25, que
são as mesmas que aplicam para a certificação de aviões
de transporte tais como Boeing747-400 e McDonnell MD-11.
Quase cinco anos após o início do projeto, em 18 de
julho de 1990, o primeiro protótipo do CBA-123,
matriculado PT-ZVE, decolou para seu vôo inaugural, que
foi realizado sem problemas. A apresentação oficial do
novo avião ocorreu no dia 30 do mesmo mês, em cerimônia
que compareceram convidados do Brasil e do exterior, e
teve presença dos presidentes do Brasil Fernando Collor
de Mello, e da Argentina, Carlos Menem, que na ocasião
batizaram o avião com o nome de Vector, nome escolhido
em concurso internacional entre mais de 6.000 sugestões.
Apenas um segundo protótipo fabricado pela Embraer
chegou a voar. No auge da campanha de marketing do
programa, havia apenas 130 opções de compra para o novo
avião. Mas tendo um preço de mais de US$5 milhões o
exemplar, caro demais para um aparelho da categoria, e
voando justamente num momento em que o Brasil vivia um
impasse político com a campanha pelo impeachment de
Collor, o projeto começou a ser seriamente ameaçado.
Some-se a isso os problemas pelos quais passava a
Embraer, e a desistência da injeção dos recursos
prometidos pelos governos Brasil e da Argentina,
finalmente o CBA-123 foi cancelado e os dois protótipos,
infelizmente, destruídos.
Mas a experiência deu três grandes ensinamentos à
Embraer, um verdadeiro Um-Dois-Três do que não fazer daí
em diante. Número Um: tecnologia útil é aquela que o
mercado está disposta a pagar. Número Dois: avião caro
não vende. Número Três: não se deve confiar na classe
política. As três lições seriam fundamentais para os
novos produtos e para a nova empresa que nasceria
daquela fase conturbada.
Crise
A Embraer pode dividir sua história em duas fases: os
anos como estatal, que vão de sua formação, crescimento
e consolidação até 1994, ano em que seu destino mudaria.
Neste período inicial, a empresa esteve na maior parte
do tempo sob o comando de um paulista de Baurú, Ozires
Silva. Ozires, como gosta de ser chamado, ingressou na
Força Aérea Brasileira em 1948. Em 1962, diplomou-se em
Engenharia Aeronáutica pelo ITA (Instituto Tecnológico
de Aeronáutica) e então trabalhou no IPD, Instituto de
Pesquisa e Desenvolvimento do Centro Técnico
Aeroespacial. Em 1964, assumiu a direção do Departamento
de Aeronaves, e em sua gestão foi iniciado o projeto do
avião Bandeirante. A partir de 1967, participou dos
estudos que levaram à criação da Embraer, que presidiu
até maio de 1986.
O desenvolvimento da Embraer resultou da existência de
uma política de governo que perdurou durante boa parte
da vida da empresa e que visava capacitar o país para
desenvolver e fabricar aeronaves. Apoiada nessa vontade
política, a Embraer cresceu e se firmou no competitivo
mercado aeronáutico internacional. Por quase 20 anos,
apesar de estatal, a empresa contou com grande
flexibilidade gerencial e exibiu resultados de vendas
ascendentes e lucros acumulados, merecendo o título de
"estatal que deu certo".
A partir de meados da década de 80, o governo federal
abandonou à própria sorte o setor aeroespacial. A
Constituição de 1988 acabou também por extinguir as
alternativas de apoio às vendas e novos
desenvolvimentos, criando real desvantagem competitiva
para a indústria nacional. Como desgraça pouca é
bobagem, as mudanças geopolíticas ocorridas no mundo,
com o fim da Guerra Fria, resultaram em sensíveis cortes
nos investimentos de programas militares, o que também
trouxe reflexos negativos para as forças armadas
brasileiras e para a Embraer.
Para piorar a situação, o mercado mundial de aviação
civil entrou em grande recessão no princípio da década
de 90, que atingiu de forma indiscriminada todos os
fabricantes. Foi dentro desse quadro de adversidades que
se desenrolou boa parte da gestão do engenheiro Ozílio
Carlos da Silva, ex-diretor e também fundador da
Embraer, que substituiu Ozires Silva como diretor
superintendente quando este deixou a empresa, em junho
de 1986, para se tornar presidente da Petrobrás.
Durante a administração de Ozílio, o desenvolvimento do
CBA-123 Vector amadureceu, o EMB-145 foi lançado e foram
iniciados os estudos do que mais tarde viria a ser o
Super Tucano. Ozílio e sua equipe tentaram conseguir
investimentos do governo para dar andamento a esses
programas, mas não obtiveram sucesso. Mesmo linhas de
crédito de agências governamentais como a Financiadora
de Estudos e Projetos (FINEP), que haviam sido
pleiteadas para custear parcialmente o desenvolvimento
tanto do CBA-123 quanto do EMB-145, não estavam
disponíveis por ser a Embraer uma empresa estatal. Como
resultado, a Embraer começou a recorrer a empréstimos
bancários de curto prazo, a juros altos, para financiar
esses projetos e girar seus próprios negócios. Isso
levou a empresa a uma ciranda financeira que resultou
num passivo a descoberto da ordem de US$1,6 bilhão,
paulatinamente estrangulando suas atividades
operacionais.
A conseqüência direta disso foi que, em novembro de
1990, a Embraer anunciou a adoção de medidas drásticas
de contenção de despesas e demitiu 4.000 de seus 12.600
empregados. Completado o processo de reestruturação,
Ozílio pediu ele próprio as contas. Para substituí-lo
foi designado o advogado João Rodrigues da Cunha Neto,
que assumiu o cargo de diretor-superintendente da
Embraer em 20 de dezembro do mesmo ano e deixou a
empresa seis meses depois, no final de junho de 1991.
Bom filho a casa torna
Ventos neo-liberais sopravam das estepes russas.
APerestroika e a queda da União Soviética apontavam a
derrocada final do comunismo. Por aqui, um Estado
pesado, centralizador e inoperante começaria também a
ser desmontado. Como uma panacéia, privatizar era a
solução para todos os males do capitalismo. Essa nova
ótica no Brasil, resultou na criação do Plano Nacional
de Desestatização (PND), gerida pelo Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Antes que a Embraer fechasse, o Planalto acordou. O nome
de consenso para dar novos rumos à Embraer foi, claro, o
de Ozires Silva, que havia saído do governo fazia poucos
meses, após ter sido ministro da Infra-estrutura na
gestão do presidente Fernando Collor de Mello. Ozires
assumiu novamente o cargo de diretor-superintendente da
Embraer no dia 16 de julho de 1991, exatos cinco anos
após tê-la deixado para presidir a Petrobrás.
Ozires retornou à presidência da Embraer e da mesma
maneira que gastou suas energias para erguê-la, agora
lutava para fazê-la sobreviver. Ao reassumir o comando,
Ozires tomou medidas draconianas. Mesmo com todo o
esforço empenhado, a situação da Embraer continuava
crítica e novas demissões foram inevitáveis, com a
dispensa de 2.500 dos 8.300 funcionários.
O quadro era feio. Demissões em massa, greves e uma
linha de produtos que incluía o Bandeirante em fim de
carreira e o Brasília. Enquanto Ozires trabalhava nos
gabinetes, nas pranchetas a Embraer desenvolvia um
"Brasília a jato". A idéia, avançada para a época, era a
de se desenvolver uma versão alongada do Brasília,
movida por dois motores turbofan com capacidade para 45
lugares. Um jato regional. A idéia era ter grande
comonalidade de estruturas e sistemas com o EMB-120 para
apressar seu desenvolvimento e baratear os custos de
produtos de produção, tornando-o assim bastante
competitivo em termos de preço, algo na casa de US$11
milhões.
Se essa nova aeronave tomava contornos definitivos, uma
nova Embraer nascia quase que paralelamente. Após ter
sido reduzida para apenas 3.200 funcionários, num
dramático processo de enxugamento, a estatal estava
pronta para a venda. Aos potenciais compradores, o
projeto EMB-145 apontava como um cartão de embarque para
vôos mais altos.
Agora sob novo comando
Em dezembro de 1994, aconteceu finalmente a privatização
da Embraer. Os novos controladores - Grupo Bozano e os
fundos de pensão Previ e Sistel - decidiram concentrar
as atividades na fabricação de aviões regionais. Junto
com os novos controladores, apareceu uma figura que
juntamente com o Major Ozires, pode ser considerada como
uma das duas mais mportantes da história da empresa.
Maurício Novis Botelho, engenheiro mecânico formado pela
Escola Politécnica do Rio de Janeiro, assumiu o comando
da Embraer em setembro de 1995. Como diretor-executivo
do Grupo Bozano, nunca havia trabalhado na indústria
aeronáutica. Descrito por colegas como "alguém que pega
a mala e vai vender avião pelo mundo", Botelho fez a
carteira de pedidos firmes da Embraer passar de 170
milhões de dólares no final de 1994 para mais de US$ 11
bilhões em pouco mais de 5 anos.
Pelo visto, avião ele sabe vender. E sabe muitas coisas
mais. A aposta na aviação regional antes que isso se
tornasse uma tendência foi o principal feito do
executivo. O plano de negócios do modelo EMB-145,
contemplava a venda de 400 unidades em 10 anos. Na
verdade, há pedidos de 1.200 aviões. Botelho tinha a
visão, e os engenheiros tinham as ferramentas para
cumprir a missão.
O fenômeno dos RJ
A Embraer vivia uma feliz coincidência. Ao mesmo tempo
que criava uma nova aeronave, o mercado se abria com
ansiedade para recebê-la. Os jatos regionais de 50
lugares eram a coqueluche da aviação, um segmento
desbravado pela Bombardier com o modelo CRJ 200, até
então único no mercado.
Mas o "Brasília a Jato", que começara a nascer ainda na
década de 80, vinha para ocupar seu lugar ao céu.
Naquela época, a Embraer tinha muita pressa e pouca
capacidade de investir e optou por manter a fuselagem do
Brasília, aumentada no comprimento para poder acomodar
45 passageiros, e também a mesma asa, ligeiramente
modificada para alcançar o desempenho pretendido. Sobre
estas seriam instalados, na posição onde anteriormente
estavam os motores turboélice, dois turbofans GM Allison
GMA 3007, cada qual com 2.900 kg de empuxo, providos de
controle digital (FADEC). Além disso o avião poderia ser
equipado seja com a eletrônica de vôo padrão do
Brasília, que utilizava uma mistura de instrumentos
analógicos e digitais. Por tranportar 45 passageiros, a
aeronave foi chamada de EMB-145.
Mas o seu desenvolvimento encontrou um sério problema:
testes realizados no túnel de ensaios aerodinâmicos da
Boeing Technologies, mostraram um desempenho
insatisfatório. O desenho da aeronave teria de ser
refito com bas nestas descobertas. Assim foi: uma nova
asa, otimizada para maiores velocidades, e motores na
parte traseira da fuselagem, resultaram na configuração
definitiva, com preço estimado de US$ 13 milhões ao
câmbio de 1992.
O novo jato era mostra cabal de que agora havia um novo
espírito na empresa. Essa nova e ágil Embraer afiava
suas garras, preparando-se para vôos mais altos.
Reconquistando a credibilidade perdida, encontrou
parceiros de peso para dividir os pesados custos de
desenvolvimento do EMB-145 (mais de US$300 milhões). Um
terço desse valor foi bancado por parceiros como a
Allison Engine Company (Motores); Parker (controles de
vôo, e sistemas); Gamesa (asas, carenagens, portas e
naceles dos motores); Sonaca (fuselagem central e
traseira, pilones dos motores); C&D Interiors (interior
da cabine de passageiros e do compartimento de carga); e
a Enaer (estabilizadores vertical e horizontal,
profundores).
Várias outras empresas somaram-se às já mencionadas para
participar do programa, incluindo o Honeywell Business
and Commuter, Aviation Systems Division (aviônicos); a
APIC-Auxiliary Power International Corp.(APU); a
Hamilton Standard (ar condicionado); a B.F Goodrich
(rodas e freios); Crane Hydro-Aire Division (controle de
freio); a ABG Semca (pressurização); a Eros (oxigênio);
a Allied Signal Fluid Systems Division (sistema
pneumático); Lucas Power (sistema elétrico); e a
Liebherr (trem de pouso), que constituiria depois uma
joint-venture com a própria Embraer, a ELEB.
Botelho era o homem certo no lugar certo na hora certa:
o momento em que a aviação regional explodiu com o
surgimento dos jatos regionais de 50 lugares. As vendas
do EMB-145, rebatizado então para ERJ (Embraer Regional
Jet) 145, explodiram após a encomenda gigante feita pela
Continental Express para mais de 100 jatos. Esta compra
abriu as portas do mais importante mercado, e logo foi
seguida por outros operadores de peso, como a American
Eagle e a US Airways.
Briga feia
O ERJ-145 entrou em operação e mostrou todas as suas
qualidades: mais leve e mais barato que seu concorrente
direto, o Bombardier CRJ, o novo jato brasileiro,
apelidado lá fora de "Jungle Jet". começou a dar um
calor na Bombardier, que não gostou de ver sua posição
ameaçada e partiu para a ignorância, denunciando os
programas de auxílio e financiamento dos jatos pela
CACEX à Organização Mundial de Comércio, OMC.
A OMC inicialmente deu ganho de causa ao Canadá. A
questão extrapolou a aviação e virou um caso diplomático
entre os dois países. A Embraer, na defensiva, acusou o
Canadá e a Bombardier de práticas desleais. A pendenga
foi finalmenete arbitrada em 2002, com a Embraer e o
Brasil rindo por último.
Em 26 de junho de 2002, a Embraer divulgou nota à
imprensa para expressar sua satisfação pela decisão da
Organização Mundial do Comércio (OMC) de dar ao Brasil o
direito de retaliar o Canadá por mecanismos de
financiamentos irregulares concedidos à Bombardier,
principal concorrente da empresa brasileira no mercado
internacional. "Fica, portanto, claro para o mundo que o
Canadá, transgressor das normas da OMC, não corrigiu os
seus mecanismos de financiamento para se adequar às
práticas legais daquela Organização", disse o
diretor-presidente da Embraer, Maurício Botelho, segundo
a nota. O valor solicitado pelo Brasil, de US$ 3,36
bilhões seria objeto de arbitragem., mas para Botelho,
mais importante que o valor foi a decisão da OMC,
favorável à retaliação. "Está de parabéns a diplomacia
brasileira por ter alcançado o reconhecimento da OMC a
mais esse relevante fato, no caminho de assegurar
condições equânimes de competição no mercado
internacional", declarou Botelho.
Outras unidades industriais
Se no front internacional a empresa briga contra
competidores poderosos, no campo doméstico havia muito o
que fazer. Em 1997, a Neiva, divisão responsável pela
fabricação das aeronaves da linha leve e construídas sob
licença da Piper, foi posta à venda, mas não apareceram
interessados.
A Embraer então decidiu transferir para a fábrica da
Neiva, em Botucatú, a produção de componentes da família
ERJ 145. A decisão foi estratégica, liberando espaço em
São José dos Campos para os jatos regionais. Além disso,
Botucatú é a única cidade do País onde já havia
mão-de-obra qualificada e infraestrutura para a
fabricação de aviões. Para dar suporte à estratégia,
desde 2000 foram investidos R$ 20 milhões na construção
de hangares, treinamento de mão-de-obra aos 930
funcionários e investimento em maquinário. Além das
peças para os jatos da família ERJ 145, vieram também as
linhas de produção do Brasília.
Mas a conquista de espaço em SJK continuava a ser
fundamental, especialmente para a nova linha de jatos de
grande porte. Em janeiro de 2001, a Embraer inaugurou o
complexo de Eugênio de Melo, num terreno de 340 mil
metros quadrados, com área construída de 45 mil metros
quadrados, que abriga as atividades de desenvolvimento e
fabricação de ferramental, fabricação de tubos, solda e
serralheria, além de grandes cablagens (montagem de
chicotes elétricos).
Outra divisão é a ELEB. Fundada em 1984 como EDE, a ELEB
surgiu de uma joint-venture entre a Embraer e a alemã
Liebherr, que adquiriu 40% do capital da EDE. Desde sua
fundação, a ELEB vem atuando no segmento de componentes
de alta performance para a indústria aeroespacial,
produzindo trens de pouso, componentes hidráulicos e
equipamentos de precisão. A ELEB trabalha com uma equipe
de desenvolvimento de produtos integrados, utilizando
sistemas como CATIA e CAD-CAM/FEA, que oferecem
avançadas ferramentas de design e simulação.
A ELEB fornece trens de pouso e componentes hidráulicos
para os jatos ERJ 135, ERJ 140 e ERJ 145, além das
aeronaves militares AMX e Super Tucano. A empresa também
é responsável pelo desenvolvimento do trem de pouso e
componentes hidráulicos para a nova linha de jatos de
grande porte.
Uma nova família
A vontade da Embraer em brigar pelos seus direitos seria
de suma importância para a sobrevivência da empresa:
cada nova venda seria batalhada arduamente e essa nova e
dura realidade só seria ainda mais exacerbada com o
lançamento do mais ambicioso programa da empresa. Em
julho de 1999, durante o salão de Le Bourget, a Embraer
comunicou ao mercado oficialmente o lançamento de uma
nova família de jatos, os Embraer 170, 175, 190 e 195,
com investimentos de quase 950 milhões de dólares.
Na ocasião foi anunciado o cliente de lançamento
Crossair (Swiss) e também o fornecedor dos motores, GE.
Em agosto de 2000, a Embraer começou a definir os
parceiros de risco para o desenvolvimento conjunto, a
exemplo do que fizera com tanto sucesso no ERJ-145. Em
outubro de 2001 aconteceu o Roll-out e em 19 de
fevereiro de 2002 o primeiro vôo. Em junho de 2003,
aconteceu o primeiro vôo do modelo alongado Embraer 175
e o início da montagem final do 190, com o primeiro vôo
previsto para o quarto trimestre de 2003.
Os maiores membros da família, os Embraer 190 e Embraer
195 (este para até 116 passageiros). serão as maiores
aeronaves jamais construídas no hemisfério sul. Sua
entrada em serviço elevará a Embraer ao time de
construtores de aeronaves comerciais de grande porte,
fugindo do escopo de aviação regional.
As vendas dos novos modelos vão muito bem, obrigado.
Somente e jetBlue, isoladamente, comprou 100 unidades do
Embraer 190 (valor da encomanda: US$ 3 bilhões) e tem
mais 100 unidades em opção. Novos clientes de peso
deverão ser anunciados a qualquer momento: oi fato é que
o Embraer 190 e o Embraer 195 simplesmente não tem
concorrentes capazes de enferntá-los oferecendo os
mesmos custos baixos, conforto interno, autonomia e
segurança.
Chegamos à parte final de nossa longa matéria sobre a
Embraer. Vmaos ver a empresa hoje e os caminhos que
apontam para um futuro brilhante.
Asas Guerreiras: um novo vetor de crescimento
Até o ano 2000, os programas militares da Embraer
atingiam pouco menos de 10% do faturamento global do
grupo. A meta para 2010 é chegar ao patamar de 35% das
vendas. São númeors ambiciosos, mas a Embraer conta com
grande trunfos no setor de defesa. Os mais importantes
são os seguintes.
EMB-312H: o Super Tucano
Ao decidir desenvolver o Super Tucano, a Embraer tinha
em mente oferecer às forças aéreas do mundo um avião
muito superior ao Tucano padrão ou de qualquer outro
modelo existente no mercado, que nãso apenas servisse
para treinamento avançado como também para outras
missões tais como treinamento de tiro de precisão,
reboque de alvos, etc. Acima de tudo, porém, ela estava
interessada na milionária concorrência, estimada em US$
4 bilhões, através do qual os Estados Unidos pretendiam
escolher um novo treinador para a Força Aérea e a
Marinha.
Essa concorrência, denominada JPATS - Joint Primary
Aircraft Training System (Sistema Integrado de Aeronave
de Treinamento Primário), resultaria numa venda de algo
entre 600 e 800 aviões, além dos pacotes de treinamento
em solo e de apoio logístico. Era necessário por
exigência da legislação loca, um parceiro americano. Em
decorrência disso, a Embraer fechou parceria com a
Northrop Aircraft Corp., empresa com a qual já havia
trabalhado no começo dos anos 70.
Um acordo preliminar entre as duas empresas foi
formalizado em maio de 1992 e em junho do mesmo ano um
protótipo foi avaliado por vários oficiais da Força
Aérea e da Marinha. Os militares tiveram em suas mãos
uma aeronave que utiliza a mesma estrutura do Shorts
Tucano, equipada com motores Pratt & Whitney Canadá
PT6A-67R de 1.600 SHP, provido de hélice pentapá da
Hartzell, com fuselagem alongada em 1,42m, assentos
ejetáveis do tipo zero-zero (utilizáveis no solo), freio
aerodinâmico ventral, sistema de geração de oxigênio de
bordo e ponto único de reabastecimento sob pressão.
Infelizmente o consórcio Beech Pilatus com seu PC-9
venceu a disputa.
O Super Tucano serviu de base para uma versão armada
para a Força Aérea Brasileira, o ALX. A FAB já fez um
pedido de 76 aviões desse tipo, que integrarão o
Programa Sivam, e tem outras 23 opções de compra.
Novas plataformas: Alerta Antecipado e Sensoriamento
Remoto
Utilizando por base o modelo 145, a Embraer desenvolveu
o EMB-145 AEW&C, uma aeronave de Alerta Aéreo Antecipado
e Controle. Com o menor custo na categoria, aeronaves já
foram vendidas ao México, Grécia e para própria FAB, que
os colocou em serviço na cobertura do SIVAM.
Igualmente baseado na plataforma do 145, o EMB 145 RS/AGS
é uma aeronave capaz de fornecer imagens e informações
eletrônicas sobre objetivos no solo em tempo real e
próximo a tempo real. Ele vem equipado com uma variada
gama de sensores complexos, que inclui um radar de
abertura sintética (SAR) de alta performance, sensores
eletroópticos e multiespectrais, e sistemas de
comunicação e inteligência eletrônica. É capaz de
atingir as áreas e altitudes de operação em muito pouco
tempo.
Prestando serviços
A Embraer sempre esteve envolvida em atividades de
cooperação, subcontratos e prestação de serviços desde
seus primórdios. Nos últimos anos a Embraer tem
procurado expandir a venda de serviços, colocando a
disposição das empresas do setor, bem como as que não
atuam no ramo aeronáutico, a sua tecnologia de ponta e
sofisticados laboratórios e meio de produção.
Contratos importantes foram assinados. O primeiro, com a
McDonnell Douglas em junho de 1987, no valor de US$120
milhões, para a fabricação de 200 conjuntos de flaps
externos, com opção de compra para mais de 100, para o
MD-11. Através de outro programa, firmado com a Boeing
em 1990, a Embraer produziu suportes usinados para os
flaps dos jatos 747 e 767. Este mesmo fabricante assinou
novo contrato, em dezembro de 1991, para a produção de
carenagens da deriva e das pontas da asa do Boeing 777.
Embraer no exterior
O mercado internacional determinou a criação de
subsidiárias no exterior: a primeira foi a Embraer
Aircraft Corp. (EAC). Fundada em 1979, esta subsidiária
comercializa e dá suporte pós-venda aos produtos Embraer
na América do Norte. A cidade de Fort Lauderdale, na
Flórida, é o local onde está instalada a EAC, que conta
com mais de 8 mil metros quadrados de área construída e
uma equipe de mais de 200 empregados.
Em 1981, surgiu a EAI, que cuida dos interesse da
empresa na Europa, Oriente Médio e África. Em 2002, as
atividades de comercialização dos produtos Embraer na
Europa foram transferidas das instalações do aeroporto
de Le Bourget para um novo escritório. Em Le Bourget,
continuam as atividades de apoio técnico aos operadores
nas regiões citadas.
Em 1997, outra expansão: a cidade de Melbourne passa a
abrigar uma unidade que atua no suporte pós-venda para
produtos Embraer. Em 2000, Beijing e Cingapura ganham
escritórios semelhantes. E em 2001, surge a EAMS,
Embraer Aircraft Maintenance Services, centro
especializado em MRO baseado em Nashville, Tennessee.
GPX: a Embraer do futuro
O dia 11 de junho de 2002 entrou na história da Embraer.
Foi nesta data que a empresa inaugurou oficialmente a
unidade de Gavião Peixoto, cidade que fica a 300km de
São Paulo, próxima a Araraquara.
As instalações impressionam: trata-se da maior pista do
hemisfério sul, (5.000m) e localizada em meio à
laranjais. O tamanho da área é 30 vezes maior do que as
instalações da empresa em São José dos Campos: nada
menos que 1.750 hectares.
Finalmente, as aeronaves executivas Legacy também serão
finalizadas num Completion Center em Gavião Peixoto,
embora as entregas continuem em São José dos Campos. O
complexo de Gavião Peixoto deverá receber investimentos
que totalizarão US$ 150 milhões até 2005, e abrigar,
decorridos 10 anos do início de suas operações, uma
força de trabalho de 3.000 empregados. A área industrial
que, uma vez completada em 2007, deverá ocupar 3,0
milhões dos 17,5 milhões de metros quadrados da área
total do terreno.
A construção do complexo deu-se em ritmo acelerado:
menos de dois anos após a assinatura de Protocolo de
Entendimento com o Governo do Estado de São Paulo (em 29
de junho de 2000) e menos de um ano e meio após o
lançamento da pedra fundamental do novo empreendimento,
em 21 de dezembro de 2000, a Embraer inaugurou
oficialmente mais este complexo industrial, embora já
usasse a pista para ensaios de vôo desde outubro de
2001.
No novo complexo de GPX (código de 3 letras escolhido
pela Embraer para designar o complexo) serão montados os
modelos militares: EMB-145 AEW&C, EMB-145 RS/AGS, EMB-145
MP/ASW, o AMX-T, a aeronave Super Tucano ALX e, caso
vença a concorrência, os Mirage 2000BR. Outra atividade
será o trabalho de modernização dos caças F-5 da FAB.
Com quase 6.000 aviões produzidos em 35 anos de
atividade, voando em mais de 80 países, 35 Forças Aéreas
e empregando mais de 12.000 colaboradores, a Embraer é a
quarta maior fabricante de aeronaves do mundo, com
encomendas que chegam a 12 bilhões de dólares. Vários
analistas do setor acreditam que antes da década acabar,
a Embraer será a terceira colocada neste ranking,
perdendo apenas para a Airbus e para a Boeing.
Quem diria que, naquela manhã de 22 de outubro de 1968,
aquele valente protótipo do Bandeirante, que decolava
pela primeira vez, abria as asas de uma empresa que
seria motivo de orgulho para todos os que amam a
aviação? Parabéns, Embraer, por seus 35 anos. Pela
amostra, os próximos 35 anos prometem muito mais.
Gianfranco Beting