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Luiz Carlos Affonso (E-Jets)

Luiz Carlos Affonso, 42 anos, engenheiro aeronáutico pelo ITA, com MBA em Administração pela USP, é o diretor responsável pelo programa dos novos jatos regionais da Embraer, a família 170/190. Ele recebeu gentilmente nosso editor, Gianfranco Beting, para uma entrevista na sede da empresa em São José Dos Campos, quando falou sobre a sua missão: colocar no ar os nossos maiores jatos regionais.

jetsite: Como anda o programa de certificação do 170?
Bem, estamos numa fase muito boa, com seis aviões voando simultaneamente, acumulando horas de vôo numa taxa muito alta. Diria que o programa de certificação, tanto a parte de vôo quanto solo, está progredindo muito bem.

jetsite: Quando começou voar o sexto avião?
O sexto avião fez seu primeiro vôo dia 27 de dezembro, apesar de estar fazendo parte da campanha de certificação desde agosto. Mas a nossa estratégia foi dedicar o avião 006 para ensaios no solo, que requerem o avião completo. Estão sendo feitos ensaios de proteção contra raios, contra interferências eletromagnéticas... São ensaios demorados, complexos.

jetsite: O protótipo 003 que tinha sofrido avarias durante um dos testes já voltou a voar?
Já voltou sim, em novembro de 2002.

jetsite: A Embraer já retomou o cronograma original?
Bem, nós estamos trabalhando no cronograma de certificação até junho e estimando a primeira entrega no terceiro trimestre. Portanto estamos apenas com um pequeno atraso em relação ao cronograma original, mas já está sendo equilibrado.

jetsite: Comentou-se que a Swiss poderia retardar o recebimento das aeronaves. Isso está confirmado?
Houve um certo alongamento das entregas, em particular as de 2003. Os números que estão anunciados de produção para 2003 e 2004 já levam isso em consideração. Na verdade a Swiss está passando por uma recuperação, e eles julgaram que seria mais prudente ter o recebimento dos aviões mais espaçados.

jetsite: Quantos aviões devem ser entregues este ano?
Devem ser entregues 16 aviões, todos eles do modelo 170. As entregas serão para a Swiss, Alitália e para GECAS. Já os 175 serão entregues só a partir do ano que vem.

jetsite: Você poderia fazer um resumo de datas fundamentais do programa?
O go-ahead para o programa ocorreu em julho de 1999, no salão de Le Bourget. Lá foi anunciado o cliente de lançamento (Swiss) e também o fornecedor dos motores, GE. Em agosto seguinte nós começamos a fase de definição de nossos parceiros de risco, para o desenvolvimento conjunto, fase que terminou em abril de 2000. Em outubro de 2001 nós fizemos o Roll-out com apresentação ao público do avião, e em 19 de fevereiro de 2002 deu-se primeiro vôo. Em julho do ano passado foi a primeira apresentação em feiras do Embraer 170, em Farnborough. Outras datas: o 175 deve voar ao final deste ano, que será histórico, pois faremos o término da certificação do 170, a sua entrada em produção, em serviço, o primeiro vôo do 175, do 195 e o início do desenvolvimento do 190.

jetsite: Como anda o programa do 190 e 195, alguma novidade? Vocês estão incorporando alguma mudança básica no projeto, com lições aprendidas nos 170?
A gestão do programa é integrada para os quatro modelos, então lições aprendidas são incorporadas continuamente. Do ponto de vista de sistemas, tanto o 170 e 175 como o 190 e 195 são parecidos, portanto a maioria dos problemas estão sendo resolvidos agora. Os futuros jatos certamente terão um desenvolvimento mais suave.

jetsite: Vocês irão certificar o 170 para operação no London City Airport?
Sim. Nós certificaremos o 170 para o London City um ano após a certificação original, esse é nosso compromisso com a Swiss.

jetsite: Para conseguir isso, foi necessária alguma mudança radical no projeto?
O 170 terá um freio aerodinâmico ventral, para que ele possa fazer o "Steep Approach", um requisito do London City. Além disso, teremos também a adoção de novos settings de flap, medidas que resolveram as necessidades do operador.

jetsite: Como você define, pelo ponto de vista técnico, a briga do 170 com o CRJ e do 190 com o CRJ 900?
O CRJ 700 é um avião alongado derivado do CRJ 200, que por sua vez é alongado derivado do Challenger: então é um avião com tecnologia de vinte anos. Eu diria que o Embraer 170 tem inúmeras vantagens em vários aspectos. Do ponto de vista de conforto, por exemplo, é inigualável. Por exemplo: o corredor do CRJ tem 17 polegadas de largura e o nosso tem 19, os assentos deles têm 17.2 polegadas o nosso 18.25 polegadas... ou seja, em todas as dimensões é muito mais confortável.
No ponto de vista de performance de pista, outra vantagem: os nossos jatos foram projetados para pistas curtas. Do ponto de vista econômico, nós fizemos um projeto voltado para a redução de custos, seja em relação a manutenção, operação ou aquisição. Portanto, além de todas as vantagens de qualidade ele é muito competitivo ao nível de custos e em termos de tecnologia está vinte anos à frente do concorrente.
O Embraer 170 está pronto para os novos requisitos do futuro: de navegação, de comunicação... nós estamos muito otimistas com as nossas vantagens competitivas.
Mas note: O competidor do CRJ 900 é o 175 não o 190 ou 195, porque o CRJ 900 é um avião de 80 ou 84 assentos e o nosso Embraer 175 é um avião de 75 assentos, porém com pitch 32... além disso, ele tem dois banheiros, e, na mesma configuração do CRJ 900, com mesmo pitch, e tamanho de galleys, ele leva o mesmo número de passageiros.

jetsite: Podemos considerar o Embraer 195 um competidor do Airbus A318 e do Boeing 717?
Nós nos colocamos, de certa forma, num novo nicho de mercado, inexplorado por aviões presentes: o 717 e o A318 são aviões maiores, para até 117 passageiros. Existe, sem dúvida, algum recobrimento e em algumas campanhas de vendas eles estão mesmo competindo. Mas nosso posicionamento competitivo é de explorar um segmento de capacidade um pouco abaixo do A318 e do 717.

jetsite: O fracasso do Dornier 728 recoloca a Lufthansa na lista de possíveis clientes da Embraer. Alguma novidade neste sentido?
Não há nenhuma novidade. Existe um esforço de venda da nossa parte e a Lufthansa sem dúvida está progredindo no seu processo de seleção, mas envolvendo todos os seus concorrentes.

jetsite: British Airways e Qantas ensaiam uma compra conjunta: essa campanha também está caminhando?
Está em andamento, mas é evidente que o cenário do mercado faz com que alguns casos a procura seja um pouco mais lenta.

jetsite: Alguma campanha de vendas importante que você possa estar comentando?
Eu diria que não. A Embraer sem dúvida está falando com todos os potenciais clientes.

jetsite: Como está o interesse do mercado norte-americano pelos jatos regionais de grande porte?
É um mercado que ainda não se moveu de forma definitiva em relação aos jatos regionais de 70 a 100 lugares. Mas está se movendo, hoje existem várias empresas olhando para essa faixa de capacidade como forma de superar a crise do momento, criando até empresas independentes para contornar a questão dos scope-clauses (NE: regras acertadas com os sindicatos de trabalhadores que limitam a compra de jatos regionais), mas com estrutura de custos que possam fazer frente às low-cost, e em muitos casos mudando o modelo de negócios. Com isso pode ocorrer uma grande transformação, uma quebra de paradigmas. Há indícios nessa direção.

jetsite: Com a US Airways saindo do Chapter 11 agora em 1º de março, é possível que a companhia possa voltar a conversar com vocês?
Nós esperamos que sim (risos).

jetsite: Você acredita que o David Siegel (presidente da US Airways e grande incentivador dos ERJs) vai continuar na companhia? Você sabe algo a respeito?
Eu não tenho nenhuma informação em relação a isso. Ele fez um trabalho excepcional na Continental e ele está liderando o processo, a minha impressão é que ele deva continuar.

jetsite: Como está vendo o cenário da aviação comercial brasileira?
Eu acho que o cenário mundial está difícil, existem talvez quatro empresas no mundo que estão tendo lucros, que são as low-cost e as empresas menores, um número muito pequeno. Estamos atravessando uma época muito desafiadora. Espero que as empresas brasileiras consigam competir e prosperar.

jetsite: A Vasp tem dito que estaria comprando 30 unidades do Embraer 170. Alguma novidade?
Não tenho conhecimento sobre essa especulação.

jetsite: Quais os preços básicos de cada uma das aeronaves?
O 170 algo em torno de 22 milhões de dólares, o 175 é 24 milhões, o 190 é de 26 milhões e o 195 é de 28 milhões.

jetsite: Vocês estão pensando em um 170 Executivo, uma espécie de Super Legacy? E em versões militares? Fale um pouco sobre esses dois possíveis derivados.
No caso do avião executivo, existem estudos nesse projeto é um programa que não está lançado. Há profissionais acessando o mercado, verificando qual seria o tamanho, enfim estamos nessa fase de prospecção de mercado. No caso do avião de defesa, sem dúvida o 170 ou o 190 podem ser plataformas muito boas também. Nós vemos esse desenvolvimento como foi o do 145: uma conseqüência natural.

jetsite: Não está trabalhando especificamente em uma versão cargo militar?
Não, não existe nenhum programa lançado.

jetsite: Sempre existe uma diferença entre o avião que foi projetado e o que está voando. As expectativas e números estão sendo alcançados?
Bem, como você deve imaginar, num desenvolvimento dessa complexidade e com muitos objetivos, é impossível sempre cumprir todos os requisitos. Existem variações, uns pontos melhores, outros abaixo do esperado.
No geral, o avião está cumprindo muito bem os requisitos originais, que foram muito agressivos. Portanto atingir o requisito já é um sucesso. Por exemplo, consumo de combustível está dentro, performance de pista também, apesar do avião ter ficado mais pesado do que o previsto. Conseguimos recuperar a performance de pista, seja com utilização de posições de flap, winglets... O ruído interno está melhor do que o previsto, foi uma surpresa. Aliás, lá em Farnborough, quem voou no avião ficou muito impressionado. Nossos custos de manutenção estão abaixo do projetado, próximos ao do Embraer 145: muito competitivos.

jetsite: Como será o suporte técnico no plano internacional?
O suporte ao cliente na verdade é um suporte corporativo, por programa. A Embraer, nos últimos três, quatro anos, cresceu muito nessa área. Desde a privatização, o suporte ao cliente tem se capacitado muito. Eu diria que hoje a Embraer tem um dos melhores suportes ao cliente, então o Embraer 170 será cuidado por essa mesma organização, que é feita por região e/ou por cliente.

jetsite: Quando foi anunciado da vitória da concorrência pela LOT, comentou-se que poderia haver uma efetiva participação da indústria polonesa no projeto. Pode comentar sobre isso?
Eu não tenho dados sobre isso. É possível que tenha outros off-sets, mas não no programa, claro que temos nossos parceiros de risco, porém não há mais espaço para isso.

jetsite: Investimento total do programa: qual o previsto e o realizado?
O previsto para o programa é de 850 milhões de dólares em dólares de 1999, hoje em dia seria quase 950 milhões de dólares, corrigindo a moeda americana. O que eu posso te dizer é que estamos dentro do orçamento, estamos cumprindo nosso plano de negócios, o que é uma excelente notícia.

jetsite: Como você vê a decisão da OMC?
A preocupação é em relação ao que os canadenses irão fazer depois da decisão da OMC, apesar da OMC ter decidido em favor da Embraer. Precisamos constatar se realmente eles irão cumprir com a determinação.

jetsite: O Embraer 190 e 195 ainda não têm compradores oficiais, não é?
O Embraer 195 participa da compra inicial por parte da Crossair: ela comprou tanto o 170 como o 195 em 1999. O 175 tem a Jet Airways, apesar de não termos ainda assinado, estamos caminhando para isso. Quem não tem clientes firmes ainda é o 190.

jetsite: Mas isso não representada nenhuma ameaça ao programa 190?
Os quatro modelos estão aprovados. Eu tenho luz verde para investir nos quatro, apenas o 190 vai ficar pronto mais tarde, talvez é por isso que as vendas ainda não estejam tão maduras, pois o avião vai ficar pronto somente em 2005. Mas há muito interesse no 190.

jetsite: Quando está previsto o primeiro vôo do 190?
Ao final de 2004, um ano depois do 195.

jetsite: No programa de certificação as seis aeronaves estão voando aqui em São José ou em Gavião Peixoto?
Aqui ficam três e lá outros três, o trabalho está sendo dividido quase meio a meio.

jetsite: O Embraer 175 vai conseguir ir para Le Bourget este ano?
Dificilmente, a feira de Le Bourget acontece em junho e ele estará voando pela primeira vez somente em julho.

jetsite: Temos muitos leitores que sonham em seguir carreira na aviação. Que conselhos, o que você poderia recomendar, com toda a sua experiência na aviação?
É uma área muito apaixonante, cheia de desafios. Nós, engenheiros da Embraer, temos uma oportunidade rara que é desenvolver um avião um avião do zero, são poucos os lugares onde pode-se fazer isso. Vale a pena.

jetsite: E nas horas vagas, você é também um apaixonado pela aviação?
Como o meu ritmo de trabalho está intenso, eu tenho tentado priorizar minha família... Mas desde a época da faculdade, eu vôo planadores. Participei de campeonatos, fui campeão brasileiro na classe olímpica em 1991. Eu sou um apaixonado por aviação, mas hoje ela foi deixada um pouco de lado... mas vou retomar!

jetsite: Muito obrigado, Luis Carlos!
Obrigado a vocês do jetsite!

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