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Marcos Antônio Bologna
O Jetsite entrevistou com exclusividade o Presidente da
TAM, Marco Antonio Bologna. Fomos recebidos nesta
sexta-feira, 28 de maio, pelo Presidente e pela
Assessora de imprensa da empresa, Anahi Guedes, nos
escritórios da presidência da companhia, no Hangar 7 em
Congonhas, São Paulo.
Voltadas para as pistas do aeroporto, as instalações são
confortáveis mas nada luxuosas, refletindo uma das
características da companhia, sua austeridade
administrativa. Dominando uma das paredes da sala está
um grande retrato do fundador da empresa, Cmte. Rolim
Adolfo Amaro. Sob a foto, um dos sete ensinamentos do
comandante parece ser seguido à risca por Bologna:
"Humildade é fundamental."
Simples, direto, sem qualquer receio, Bologna deu uma
entrevista de mais de duas horas, em que falou da
empresa, das concorrentes, do setor, apontando caminhos,
defeitos e virtudes com coragem e clareza. Jovem para o
cargo, Bologna tem pela frente enormes desafios. Nossa
nítida impressão, ao final dessas duas horas, é de que a
TAM tem um excelente comandante e um sólido plano de
vôo, tanto para vencer as muitas dificuldades que se
apresentam como para continuar a ocupar a liderança do
mercado doméstico e um exemplo mundial de companhia
aérea.
Jetsite: Marco Antonio Bologna, presidente da TAM. O
sr. é paulistano, Presidente?
Paulistano, sim, com muito orgulho.
Jetsite: Palmeirense?
(Carregando no sotaque ítalo-paulistano) Maaarco
Antôôônio Boloooogna. Com esse nome, eu só podia mesmo
ser palmeirense! (risos)
Jetsite: Muito bem, por mim a entrevista já está
encerrada. O mais importante já foi respondido! (risos)
Não, voltando, o senhor veio do mercado financeiro, não
é?
Sim, mas sou engenheiro, o que é sempre útil na aviação.
(risos) Tenho 49 anos, formado pela Politécnica da USP
como Engenheiro de Produção, com extensão em Finanças na
Universidade de Manchester, Reino Unido. Eu não sou o
famoso Engenheiro Que Virou Suco: sou o Engenheiro que
Virou Bancário. Por 24 anos, trabalhei no Mercado
Financeiro em bancos multinacionais como o Crédit
Lyonnais, Chase Manhattan, Lloyds e depois no Banco
Itamaraty, do Dr. Olacir Francisco de Moraes. Através da
relação comercial entre o Itamaraty e a TAM é que eu
primeiro tive contato com a companhia.
Jetsite: Fale um pouco sobre sua carreira na TAM. O
Sr. entrou e depois saiu, para retornar como presidente?
O Comandante Rolim queria profissionalizar a
administração da empresa e em 2000 a TAM e contratou a
empresa de Consultoria Booz Allen para fazer um plano de
reestruturação. Foi então que se identificou a
necessidade de contratar um CFO, Chief Financial Officer,
até porque a empresa pretendia lançar-se no mercado de
capitais e fazer um IPO, na época, pois o objetivo era
lançar ações até o final de 2001. Fui sondado pela TAM
para ocupar o cargo, algo que se materializou em março
de 2001.
Mas nesse ano perdemos o Comandante, e enfrentamos as
conseqüências do 11 de Setembro. Com isto tudo, a TAM
passou de um Céu de Brigadeiro para uma jornada
turbulenta. Nessa nova realidade, cancelamos o
lançamento de ações e tivemos a necessidade de fazer um
enxugamento, uma grande reestruturação. Cortamos vôos
internacionais como Frankfurt e Montevideo e iniciamos
um enxugamento de oferta e pessoal.
Jetsite: Um período difícil para todo o setor.
Sem dúvida. Em 2002, tentamos novamente entrar no
mercado de capitais, mas a economia entrou em
turbulência em função do processo sucessório, com
conseqüencias nefastas para a aviação, como por exemplo,
o dólar batendo na casa dos 4 reais. Com a crise
instalada, ao final do ano, a TAM foi ao BNDES tentar
uma captação em caráter de "Bridge", lembrando que a
própria Varig estava no banco tentando recursos para
tirá-la de sua própria crise.
Sentimos que o BNDES não iria responder positivamente,
até porque estávamos no fim de um mandato.
Jetsite: Vem dessa época a idéia de fusão?
No final de 2002, decidimos contratar a consultoria Bain
And Company para reestrutrurar mais uma vez a empresa e
prepará-la para a nova situação do mercado doméstico, no
qual preço dos serviços passou a ser o principal
elemento de decisão na compra dos bilhetes.
No início de 2003, o setor encontrava-se na iminência de
um colapso. A Varig, com 40% do mercado, estava doente.
O BNDES dava então claros sinais de que não auxiliaria o
setor enquanto houvesse excesso de oferta, mas sinalizou
que isso seria possível se TAM e Varig estudassem alguma
forma de cooperação.
Do âmbito desses estudos, nasceu a idéia que poderia
levar à uma fusão e uma das primeiras medidas foi
assinar um acordo de code-share, até porque a Varig
estava perdendo 29 jatos para a GECAS e a TAM estava
mesmo com excesso de capacidade: entre 2000 e 2001,
adicionamos 39 jatos Airbus, na crença, não confirmada,
de um mercado mais saudável e de uma maior participação
da TAM neste mercado.
Jetsite: A TAM ainda considera uma fusão com a Varig?
Nesta época, começamos a perceber que o processo seria
extremamente complicado, em função de contingências
fiscais e trabalhistas, e os processos que apareceram
por parte de funcionários e acionistas minoritários,
além de ficar claro qual seria o volume de recursos
necessários para efetivar a fusão e tornar viável a nova
empresa.
Jetsite: Como foi que o Sr. voltou à TAM?
No começo de 2003, fui sondado para assumir um cargo no
novo Governo Federal, e logo depois, um convite da
iniciativa privada, que acabou me conquistando. Fui
então, em 30 de Abril, trabalhar no Grupo Vale Refeição.
Mas como eu já havia provado dessa cachaça que é a
aviação, eu continuei vindo aqui, convidado, ou mesmo
informalmente, conversando com os colegas, com a família
Amaro. Com a saída do Daniel Mandelli Martin, uma das
sete cadeiras do conselho de administração da TAM ficou
vaga. E por ter uma excelente relação com a família, fui
convidado então para assumir essa cadeira vaga no
Conselho da TAM S.A. Além disso eu tenho uma tremenda
admiração pela família, pela dedicação e fidelidade.
Jetsite: Estava acertada a sucessão?
Não. Com a saída do Daniel, assumiu interinamente a
direção da TAM o VP do Conselho, Antônio Luis Teixeira
de Barros. Houve um período de interinidade e de muitas
conversas com todo mundo. Daí, conversa de lá, conversa
de cá, os acionistas da empresa acharam que meu nome
seria uma opção válida para a Presidência. Afinal, eu
gozava da confiança da família Amaro, não representava
uma ameaça à cultura da empresa, e como conhecia muita
gente envolvida com a empresa, tanto dentro como fora
dela, no final do dia eu estava já na base do "Plug and
Play". No dia 19/12/2003 veio um convite formal e então,
em 19/01/2004, eu assumi o posto.
Jetsite: Como está estruturado o conselho da TAM?
São sete cadeiras, sendo cinco ocupadas por pessoas
indicadas pela TEP - TAM Empreendimentos e Participações
- que detêm 72.2% das ações da empresa e pertencem à
família Amaro. Outros dois assentos são ocupados por
membros indicados pelos Fundos de Investimentos, que
detêm 26,85% das ações. E para completar, há mais 0,05%
de papéis pulverizados no mercado. O conselho é
presidido pela D. Noemi. As reuniões são mensais e
trabalhamos dentro de metas e planos traçadas
regularmente.
Jetsite: De regional a intercontinental em 10 anos:
qual o segredo do sucesso da TAM?
O sucesso da TAM deve-se às suas pessoas e começa pela
percepção do comandante Rolim, que por conhecer o Brasil
como poucos, identificou o enorme potencial do interior
do país. A TAM se fixou como regional e foi crescendo,
ocupando o espaço abandonado pela grandes empresas
aéreas nacionais. Mas o fato principal é: o Comandante
Rolim estabeleceu uma cultura, que ensina que a TAM é
aliada do passageiro, do cliente. O Espírito de Servir,
o tapete vermelho, essa magia da proposta de nosso
produto. Que tudo o que fazemos é por ele e para ele,
consumidor.
Jetsite: Falando em mercados regionais: há interesse
da TAM em voltar a eles?
Não diretamente. A TAM pretende ampliar seus acordos com
empresas regionais puras, buscando manter e ampliar
acordos de serviços de alimentação e distribuição (feeder)
com a Pantanal, Ocean Air, Passaredo, Trip.
Jetsite: Como esse Espírito TAM funciona da porta pra
dentro?
O Cmte. Rolim criou uma empresa no qual se busca
austeridade, ética profissional, responsabilidade
social. E uma empresa que sempre se equilibrou
financeiramente, pagando sempre os seus salários em dia.
E sempre lutando pelo setor. E foi justamente a perda do
Comandante Rolim que mostrou que sua luta em
profissionalizar a TAM era fundamental.
Jetsite: É grande a falta que ele faz?
Claro que a perda é irreparável, não apenas para a
empresa como para o setor. Se ele estivesse ainda hoje
aí, a história da aviação brasileira, e não apenas da
TAM, seria completamente outra. A fusão com a Varig, a
situação concorrencial, enfim, tudo seria completamente
diferente.
Jetsite: Como o Sr. definiria os princípios básicos
da TAM?
A TAM não é mais uma empresa One Man Band, embora esse "One
Man" tenha deixado os valores e as culturas, que
tratamos de aplicar: o comandante no pé da escada, o
sorriso, a humildade. doutrinas que seguimos. São seis
pilares. O primeiro, ter as "best practices" de mercado:
gestão profissionalizada, ética profissional. O segundo
é buscar ser líder na produtividade e com isso, custos
competitivos e pricing inteligente. O terceiro pilar,
por ser uma concessionária, é ter excelente relação com
o poder concedente, com uma integração que faz com que a
TAM tenha uma atitude pró-ativa, propondo sugestões a
todo o setor. Outro pilar é a de estrutura de capital e
gestão financeira. Este negócio é um grande cash
management, e a gente persegue o capital externo para
nos dar musculatura para maiores desenvolvimentos. E o
último pilar são os vôos internacionais, porém em rotas
seletivas e rentáveis.
Jetsite: Na sua administração, a empresa busca
consolidar e ampliar a liderança no mercado doméstico,
um crescimento de participação a qualquer custo ou
trabalha com um compromisso com resultados?
Eu aplico o primeiro dos sete mandamentos do Cmte.
Rolim: "Nada substitui o lucro." As empresas estão
abandonando a luta pelo domínio do mercado e olhando
mais para os resultados, aqui e no mundo. A
desregulamentação nos USA mudou o ciclo de vida das
empresas nos Estados Unidos. Lá a batalha num ambiente
desregulamentado, diminuiu o ciclo de vida das empresas
aéreas. Até porque lá, diferente do que acontece aqui,
quem não paga as contas fecha as portas. E lá, o Governo
Federal sabe a importância que o setor tem, e tem
dinheiro para atuar e se necessário, intervir mesmo. No
caso brasileiro, há ainda a discussão se somos
infra-estrutura ou bem de consumo. Além disso, o nosso
Governo não tem dinheiro para colocar na aviação.
Jetsite: Até por razões políticas?
Sim, se estamos discutindo Fome Zero, saneamento, saúde,
prioridades maiores, não dá pra imaginar agora o Governo
sacando um programa de ajuda ao setor aéreo. O Governo
também reluta em colocar dinheiro no setor pois ele
percebe - e nisso eu concordo - que o setor como um todo
não tem um nível de capacitação profissional ou de
gestão profissionalizada e governança corporativa que
também o motivasse a colocar dinheiro. Veja o caso do
setor nos Estados Unidos. Só se tem acesso aos recursos
desde que a empresa cumpra com muitos requisitos, nenhum
deles fáceis de atingir. Aqui no Brasil, até no sistema
financeiro o rigor é maior do que na aviação, embora
sejamos concessionárias de um serviço público.
Jetsite: Ou seja: o Governo deveria ser mais
criterioso na hora de pensar em ajudar as empresas? Qual
seria um critério na sua opinião?
O Governo deveria considerar o que eu chamo de Três "Cês",
que são: Cadastro - quem é o senhor, quais as suas
credenciais para ser gestor de uma concessão pública. O
segundo é a Capacidade: se a empresa tem capacidade
técnica para gerenciar o negócio e terceiro, se tem
Capitalpara tocar o negócio. Hoje, para abrir uma
empresa aérea no Brasil, basta ter um bom engenheiro
aeronáutico e um bom Comandante que qualquer um ganha a
concesssão. Quem é o gestor? Qual a origem do capital?
Nada disso é perguntado.
Jetsite: O presidente da American Airlines, Robert
Crandall, há pouco tempo afirmou: "Há algo de
fundamentalmente errado com um negócio que não consegue
recuperar nem os custos de capital." O Sr. acha que a
aviação está simplesmente bêbada ou está doente?
Acho que o setor está passando por uma transformação. Os
tempos de glamour já se foram. Hoje, no mundo todo,
estamos percebendo que este é um negócio como outro
qualquer, e as empresas hoje estão voando para ganhar
dinheiro, o que já deveriam fazer há muito tempo. Outro
aspecto importante é que o setor, por ter uma
característica de investimentos pesados e de longo
prazo, requer alguma regulação. No caso do Brasil a
regulação hoje passa por um maior controle de
capacidade.
Jetsite: E o que o Sr. acha disso? Acha justo o
controle de oferta e de preços?
Acho. No mesmo sentido do setor financeiro, onde há uma
política monetária, onde o Banco Central funciona como
guardião da Moeda, que impede o colapso da Moeda. Na
aviação, deveria haver uma meta de Load Factor maior que
oBreak-Even, sem a qual o setor também entraria em
colapso e no final, a conta cairia na mão do Governo,
como aliás já vem acontecendo. A TAM já enviou até uma
proposta de regulamentação e redistribuição para o
Governo.
Jetsite: E qual seria essa proposta-modelo de
regulamentação?
Dado um crescimento de demanda inferida, o Governo
distribuiria o aumento de capacidade pela média de
participação de mercado dos últimos seis, doze meses.
Quem não conseguisse atingir essas metas, voltaria na
próxima reavaliação para um "buffer." Isso não
congelaria a participação nas porcentagens atuais pois
premiaríamos as empresas que atingissem um Load Factor
maior do que o esperado com uma tabela de premiação. E,
claro, controlando também os preços utilizados para
chegar a esse Load Factor. Veja: ainda há no Brasil
poucos passageiros e companhias aérea demais. Lembre que
no Brasil 4 empresas concentram 98% da oferta.
Jetsite: Sendo assim, o senhor concorda com a
política de mono-designação em vôos internacionais?
Primeiro, lá para trás erraram ao deixar 4 empresas
brasileiras voarem para o exterior. Vasp, Transbrasil,
TAM e Varig, todas elas nos Estados Unidos? O Governo
Collor escancarou os acordos bilaterias. Mais nenhum
outros país tem isso. É daí que vem o enfraquecimento da
Varig. No começo dos anos 90, a Varig tinha mais de US$
1 billhão em caixa. Veja como ela está hoje.
Jetsite: E qual a sua proposta?
Mono-designação por destinos. Por exemplo, a Varig
sairia de Paris e de Miami. Nós temos um produto melhor
e parceiros melhores, Air France e American Airlines. A
Varig fica com Frankfurt, onde é parceira da Lufthansa.
Agora, se for para designar um única empresa de
bandeira, me avise, que vou querer vender meus direitos
de tráfego nessas rotas e meus Airbus A330.
Jetsite: Porque a TAM não está em nenhuma das grandes
alianças?
Temos duas excelentes parcerias: Com a Air France que é
Skyteam e American Airlines, que é Oneworld. Primeiro
precisamos definir nossa estratégia internacional de
parcerias, antes de definir pela entrada em uma ou outra
aliança. Lembrando ainda que a American Airlines, a
empresa aérea norte-americana dominante na América do
Sul, escolheu ter apenas duas empresas parceiras na
América do Sul: LAN e TAM.
Jetsite: Quais os planos de expansão nos serviços
internacionais?
Hoje temos 9 A330, sendo que 5 estão sendo usados em
nossas linhas e 4 estão arrendados à outras empresas.
Dois contratos expiram em novembro de 2004 e os outros
dois em novembro de 2005. Para estes dois que poderão
voltar agora, estamos avaliando alternativas, sobretudo
no mercado norte-americano. Com a American Airlines,
estamos estudando opções como New York e Chicago,
importante hub da AA. Na Europa, depende um pouco da
fusão Air France / KLM, para ver quais possibilidades de
apresentam. E é quase certo que a gente retome os vôos
Manaus - Miami com A320.
Jetsite: A TAM pretende usar os direitos de tráfego
da TAM Mercosul, Quinta e Sexta liberdade, para a
Europa?
Não temos necessidade. A Mercosul tem Quinta e Sexta
Liberdades para Madrid, mas é um mercado de low-yield.Temos
o direito também para Santiago e Caracas, onde os
Acordos Bilaterais estão fechados, e essa é uma
possibilidade.
Jetsite: Como competir internacionalmente carregando
os "Custos Brasil" nas costas?
Aí é um problema para qualquer setor. É por isso que a
entrada em vôos internacionais precisa ser bem pensada.
A gente paga muito mais caro pelo capital e impostos que
nossas concorrentes.
Jetsite: A TAM processou a União pelas perdas do
Congelamento de Tarifas a exemplo do que fizeram as
concorrentes?
Sim. Estamos saindo do TRF e indo para o STJ, onde já
estão Vasp e Varig. A Vasp pede, a grosso modo, dois
bilhões; a Varig três e a TAM pede 900 milhões de reais.
Não discuto o mérito da ação, que vai ser mais um
esqueleto no armário da União. Mas há uma grande
diferença: no caso da Vasp e da Varig, haverá um
off-set, já que as dívidas que ambas têm com o governo
servirão para um acerto de contas. Já no caso da TAM,
que não tem dívidas, se ganharmos esses 900 milhões de
reais, isso é dinheiro em caixa.
Jetsite: Fale mais um pouco sobre as empresas
concorrentes.
Lembre-se em primeiro lugar que a empresa que detêm 30%
do mercado doméstico e 85% do internacional tem um sério
problema. Isso é público e notório. Basta ver o balanço
da Varig no www.cvm.org.br e você vai ver que a Varig
tem dois bilhões de dólares de passivo, dois bilhões de
patrimônio líquido negativo para dois bilhões de dólares
de faturamento bruto.
Jetsite: E a Vasp?
A Vasp também tem um problema financeiro e aliado a isso
um problema sério de concepção de produto, um produto
desatualizado. O passageiro quer voar em avião novo,
outra mudança no seu comportamental. E tem uma empresa
entrante, a Gol, que tem 21% do mercado e que nasceu na
era da web, sem legado, obviamente com um custo menor. E
a TAM, que ficou pagando suas contas o tempo todo, sem
dispor do benefício desse "financiamento" do erário ao
seu crescimento. Ela tem um produto atualizado, bastante
atualizado. Mas agora a TAM tem de perseguir o
benchmarkde custo no mercado, que agora é a Gol.
Jetsite: É por isso que o Sr. acredita que precisa
haver um controle maior no mercado?
Claro. Enquanto não houver uma assepsia dessas
contingências citadas, o ideal é que haja um controle,
exeterno, de auto-sustentabilidade financeira do
sistema, porque senão a competição fica desleal. Aquele
que está sendo financiado pelo erário acaba usando esse
fundingpara sustentar políticas comerciais agressivas,
num processo autofágico - um círculo vicioso, que volta
ao erário.
Jetsite: O senhor, que defende a necessidade de um poder
regulador, está confortável com o desempenho dos órgãos
que hoje regulamentam o setor?
Como política de governo, precisa haver um alinhamento
para as agências que já existem. E o projeto da ANAC,
que foi interrompido? A primeira coisa é definir qual o
modelo de funcionamento das agências. Em paralelo,
utilizar a lei PPP, das Parceria Públicas e Privadas,
que seria perfeita para definir claramente a questão da
infraestrutura aeroportuária. Eu gostaria de lembrar que
a última reunião do CONAC, Conselho Nacional da Aviação
Civil, foi em novembro de 2003, quando foram definidas
18 resoluções. Entre elas, a desoneração do setor. No
entanto, desde então ocorreu o contrário: nós, a muito
custo, conseguimos salvar o setor de ter de pagar novas
taxas através do COFINS.
Jetsite: O que pode ser feito agora?
Implementar as resoluções do CONAC e tirar entraves que
estão aí. Como a política de formação de preço do
querosene. Ninguém quer combustível subsidiado. Queremos
equiparação com os preços internacionais. A gente paga o
preço CIF e não FOB, como se tivéssemos de importar o
combustível, o que já daria mais de 13% de economia no
preço do combustível. Ou ainda ao ATAERO, o adicional
tarifário que faz dos aeroportos brasileiros os
terceiros mais caros do mundo. Esse adicional foi criado
para financiar a contrução de Cumbica, o aeroporto já
está aí há quase 20 anos e estamos pagando o imposto até
hoje.
Então a proposta da TAM é esta: usar o CONAC como fórum
para, juntos, discutirmos o que queremos para o setor. E
discutir outros temas tão variados como importantes,
como a aviação regional, linhas especiais de
financiamento para aeronaves da Embraer. Repito: é
preciso rediscutir todo o regulatório que está aí. Ele é
um marco de transição, criado num sistema de pré-colapso
do sistema, que introduziu a portaria 243 que diz:
controlo o sistema, sem dizer como, sem explicar quais
as réguas do sistema.
Jetsite: Como o Sr. avalia a atuação do DAC?
O CONAC regula o setor, cabendo ao DAC executar as
políticas do setor. O que aliás faz muito bem. O DAC não
é culpado: ele apenas executa as políticas definidas.
Lembro apenas que o DAC cumpre também um papel
importantíssimo e muito bem feito: os aspectos técnicos,
os controles de navegação, de controle de segurança, que
acredito que nenhum órgão civil faria tão bem. Lembre-se
que iria sair a ANAC, não saiu e o DAC ficou abandonado,
sem orçamento.
Jetsite: E a questão levantada recentemente de
formação de cartel entre Tam e Varig?
Com um modelo claramente definido, a gente poderia se
defender de acusações como estas. Mostrar como se formam
preços neste setor para que a gente não sofra com
conclusões precipitadas como esta. Porque a exemplo de
detergents ou biscoitos água e sal, que também têm
preços semelhantes, nós temos também processos
produtivos parecidos. Os custos são semelhantes, de
aeroportos, querosene, salários, leasing de aeronaves. é
tudo muito semelhante. Mas se a Gol, digamos, lança uma
tarifa super barata na Ponte Aérea, a 100 unidades, eu
vou tentar fazer igual, senão eu perco os passageiros
para eles. Os preços ficam parecidos, é claro. Mas isso
não significa que nós nos cartelizamos.
Jetsite: No Brasil, o Sr. diria que o preço hoje é o
fator determinante na escolha de uma companhia aérea?
Um dos fatores, diria que é o terceiro. Antes viriam,
numa escala de importância, a malha, a rede de destinos
servidos pela empresa, depois o fator segurança e em
terceiro o preço. Aquilo que é premium, ou seja, a
qualidade de serviço, conta hoje muito menos, não dá
para cobrar mais do que 10% que a concorrência. O
passageiro pagaria um pouco a mais para ter mais espaço
no avião, menores filas nos aeroportos, etc. Mais que
isso, é difícil hoje em dia.
Jetsite: Então a TAM vai perseguir os menores custos
do mercado?
Entre outras coisas. Nossa visão é atingir algumas
metas. A primeira é manter a liderança no mercado
doméstico, posição que ocupamos, graças a Deus, desde
Junho de 2003. Queremos também manter o nosso padrão de
serviço, o que muita gente confunde com serviço de
bordo. Eu quero dizer por serviço nossa malha de rotas,
pontualidade, regularidade, serviço de bordo, avião
novo, entretenimento a bordo. E nas refeições, algo mais
light, que é o que os passageiros desejam.
Jetsite: Mas no caso de serviço de bordo, do
catering, com o code-share, o padrão da TAM caiu. Alguma
chance do velho padrão de refeições voltar?
Desde que os custos parem de pé. Lá fora, a indústria
está caminhando para as refeições pagas, o "Buy on Board".
Aqui não dá, por enquanto, para cobrar. Então fizemos
uma matriz simplificada de serviço de bordo, onde
cruzamos a etapa média com o horário de partida e
determinamos o que vamos servir.
Jetsite: Mas nos vôos internacionais é diferente.
Claro, pois nesses serviços paga-se mesmo pela
qualidade. Aqui, o padrão da TAM é imbatível: o
passageiro que sentou na Primeira Classe e pagou por
isso US$ 7.000,00, vai tomar champagne Dom Perignón e
comer caviar Beluga. Na Business, vai deitar numa
poltrona com 180º de reclinação e vai tomar sua Veuve
Cliquot. E o passageiro da econômica vai ter seu video
individual. Mas o que se via antes, refeições quentes em
vôos de trinta minutos, - eu costumo brincar com os
tripulantes dizendo que aquilo era o famoso "Se vira nos
trinta" - isso não vai acontecer mais.
Jetsite: Ainda falando de produto: como o senhor
posicionaria a TAM?
Olha, há três eixos na construção de nossa marca. O
primeiro é malha, frequëncia e destinos. E aqui a Varig
lidera, especialmente por causa dos vôos internacionais.
Então vamos lançar no segundo semestre uma campanha que
irá abordar exatamente esse aspecto, nossos destinos,
que são muitos. Outro eixo é o atendimento, o padrão TAM
de serviço, lembrando que a gente sempre pensa que,
embora 80% dos motivos de viagem no Brasil sejam Pessoas
Jurídicas, por razões profissionais, nós sempre
transportamos Pessoas Físicas. E que elas, ao voar Tam,
terão sempre o melhor serviço do Brasil, com o melhor e
mais descomplicado programa de fidelidade. O último
eixo, que é o de preço, precisa ser retrabalhado: a TAM
não pode ter a percepção de ser uma empresa careira. E,
para completar, queremos dizer que somos uma empresa
brasileira, não uma empresa paulista, pois temos algumas
barreiras culturais em mercados como o Rio de Janeiro e
a região Sul. Onde, aliás, fomos ajudados pelo
code-share com a Varig, pois muitos passageiros dessas
regiões voaram conosco pela primeira vez desta forma.
Jetsite: Então a TAM quer se "reposicionar" como uma
empresa Low-Cost?
Com custos menores e nosso sistema de Yield Management
dá para buscar praticar preços menores. A TAM ganhou
participação de mercado por ter um custo menor do que as
concorrentes. E agora busca novamente ser o benchmark do
setor em termos de custos. A TAM está querendo ser e
está no caminho de fazer o que a Aer Lingus fez.
(NE: a Aer Lingus é a empresa de bandeira da Irlanda e
vivia uma séria crise financeira, com reais
possibilidades de fechar as portas. A empresa se
"reinventou" com sucesso, como empresa aérea de tarifas
simplificadas, custos mais baixos, frota unificada em
dois tipos de aeronaves e está finalmente saindo da
crise, com grande parte de suas vendas hoje diretamente
pela internet).
O que fez a Aer Lingus? O grande desafio é aumentar
nossas vendas diretas, no mertcado web ou callcenter. O
que é difícil, porque nascemos num padrão de vendas
indiretas, via agentes de viagens e terceiros. É mais
fácil para a Gol, que nasceu vendendo direto na web. Nós
vendemos apenas 17% diretamente, contra quase 50% da
Gol. A Aer Lingus saiu de 1% para 50% de vendas diretas.
Estou tentando aprender o que eles fizeram pra conseguir
isso.
Jetsite: Qual o sistema de yield management que a TAM
usa?
É o AIR MAX, desenvolvido pela American Airlines. E a
SABRE, outra empresa do mesmo grupo, otimizou o sistema
para nosso uso.
Jetsite: Ainda falando de produto: a TAM quer
incrementar seus sistemas de entretenimento de bordo?
A tecnologia e infra-estrutura no Brasil ainda não
permitem TV ao vivo como faz a jetBlue, mas estamos
sempre investigando. Mas para equipar os A320/319 o
custo é de mais de US$ 500.000,00 por avião.
Jetsite: Quais os planos de substituição dos F100?
A idéia é substituir todos eles em mais 5 anos e também
alguns Airbus. Como nós temos encomenda para mais 10
A319 / A320 firmes, com PDP (Pre Delivery Payment) já
feitos na Airbus e mais 10 opções, nossa previsão é que
em 5 anos, traremos mais 20 jatos para substituição
desses que saem e mais 5 jatos para crescimento.
Queremos trazer apenas A320, pois estamos trabalhando
com a Airbus num LIP - Lift Improvement Program - para
permitir que os A320 operem também no Santos Dumont.
Jetsite: E a Embraer?
Em 2001, em Le Bourget, o Cmte. Rolim anunciou que a TAM
compraria 40 Airbus A318 e mais de 50 jatos das famílias
170/195. Os jatos da Embraer significam uma oportunidade
para rotas de média densidade e etapas mais longas, sem
passar por hubs. O Embraer 190/195 seria ideal para
rotas como Florianópolis / Brasília. Se o ICMS cair, se
essa restrição fiscal cair, houver financiamento de
longo prazo, em moeda local, aí fica imbatível.
Jetsite: E a TAM iria então às compras em São José
dos Campos?
Claro. Lembre que há um hedging natural, diminuição de
custos de estoque - as peças de reposição estão aí do
lado, enfim, seria um grande negócio.
Jetsite: E a TAM Express? Quais os planos para ela?
Olha, estamos reavaliando o negócio. Estamos chegando à
conclusão, estou cada vez mais convicto, que nosso
negócio é ficar mesmo no atacado: o que mais nos
interessa, o que é mais lucrativo para o Grupo é
concentra-se no transporte de terminal de carga a
terminal de carga. O transporte porta-a-porta agrega
pouco resultado. Estamos estudando o que fazer e vamos
talvez rever o processo.
Jetsite: Quais os planos para o Centro Técnico da TAM
em São Carlos? A TAM quer mesmo entrar para valer e
disputar mercado de MRO na América Latina?
O investmento que já fizemos é enorme e vamos continuar
investindo. Mas estamos avaliando se ele será mesmo
outro "Profit Center," uma unidade de negócios gerando
resultados positivos. O objetivo de longo prazo do Cmte.
Rolim era transformar aquilo tudo numa espécie de "TAM
Technics."
Jetsite: Ainda em São Carlos, como vai o projeto do
Museu Asas de Um Sonho?
Já temos 43 aeronaves, o projeto estamos tocando, a
entidade que organiza e coordena o projeto, a EducTAM
está pronta, inclusive com a Lei Roannet, e a gente
acredita que em 2004 tudo estará definido e começaremos
a implantação definitiva. E esperamos, com a volta dos
lucros, voltar a colocar parte dos impostos a pagar no
projeto do museu.
Jetsite: Para concluir: aviação é também uma paixão,
virou um hobby?
Bem, claro que apaixona sim, mas minha verdadeira paixão
são as motocicletas.
Jetsite: Harley-Davidson também?
Não, BMW. Harley-Davidson não é motocicleta.
Harley-Davidson é Harley-Davidson!
Jetsite: Muito obrigado, Presidente.
Obrigado a você, Gianfranco, pelo espaço para a TAM no
Jetsite.