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O imortal Constellation


Todo mundo tem um tipo, um avião, um modelo preferido. Para a maioria dos veternaos, a chance do Constellation (ou "Connie" para os íntimos) figurar no topo da lista é enorme. Projetado e construído pela Lockheed Aircraft Corporation sob rígidas especificações do legendário Howard Hughes, o Constellation daria não apenas início a uma nova era no transporte aéreo mundial, mas talvez, acabasse mesmo tornando-se o maior ícone dessa época, a mais glamourosa da aviação comercial.

Nasce o mito

O projeto original da Lockheed contemplava uma aeronave de longo alcance, capaz de voar sem escalas entre Nova York e Los Angeles. Foi desenvolvido pela equipe de projetistas liderada por Clarence L. "Kelly" Johnson, responsável pelo Electra I e Lodestar.

Inicialmente, o novo avião teria capacidade para até 40 passageiros, e seria batizado de Lockheed L-44 Excalibur, despertando o interesse da Pan American Airways. Durante o processo de desenvolvimento, a Pan Am solicitou um aumento de tamanho e fuselagem pressurizada.

Em junho de 1939 a TransContinental & Western Air (mais tarde conhecida como TWA), na figura do seu maior acionista, Howard Hughes, fez pública a necessidade de uma aeronave capaz de voar 3.500 milhas náuticas com aproximadamente 3500kg de carga útil. Graças à grande semelhança de ambos os requisitos, a Lockheed decidiu, com o apoio financeiro de Hughes, mesclar ambos os projetos, passando a chamar o avião de Lockheed 49 Constellation (Connie para os íntimos).

Ao final de 1939, surgiu o projeto definitivo do novo avião, equipado com motores Wright R-3350 de 18 cilindros e 2.200hp, equipados com hélices de três pás com quase cinco metros de diâmetro. Isto criou alguns desafios para a equipe de projetistas: muitas das características finais do avião, como as longas pernas do trem de pouso, são conseqüência do grande tamanho dessas hélices.

A forma da fuselagem do Constellation é até hoje considerada uma das mais graciosas e elegantes já concebidas. Ao projeto da asa foi dada especial atenção: sua forma foi inspirada no projeto do caça Lockheed P-38 Lightning, proporcionando uma performance que surpreendeu até mesmo os engenheiros da Lockheed.

De uniforme

A excêlencia técnica do projeto só aumentou a confiança das empresas, que fizeram 80 encomendas iniciais, sendo 40 da TWA e 40 da Pan American. Mas a entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra fez com que todas as aeronaves fossem destinadas à USAAF (US Army Air Force). No total, 180 unidades da versão militar C-69 foram compradas, quando o primeiro protótipo finalmente fez seu vôo de estréia em 9 de janeiro de 1943. O programa de testes estendeu-se até o final de 1944 e as primeiras entregas foram realizadas no início de 1945, já no final da guerra.

A participação efetiva do C-69 no conflito foi bem reduzida, à 15 unidades usadas em vôos de transporte entre os Estados Unidos e a Europa. A USAAF reduziu o número de encomendas para 73 e a Lockheed converteu as aeronaves na linha de produção para o mercado civil. Esta versão ficou conhecida como L-049 e foi homologada para uso em dezembro de 1945, com entregas para a Pan American e TWA logo em seguida.

O primeiro vôo comercial foi realizado em fevereiro de 1946 (Pan American) entre Nova York e Bermuda. No mesmo mês, a TWA colocou seus Constellation em operação entre os Estados Unidos e a Europa. Pouco tempo depois, a BOAC comprou cinco unidades, para voar entre Londres e Nova York.

Voltando do Combate

Finda a guerra, a Lockheed desenvolveu uma versão aperfeiçoada, voltada ao mercado civil. Conhecida como L-649, tinha capacidade máxima para 81 passageiros. Entrou em operação em 1947 nas cores da Eastern Airlines, mas foi logo substituída pelo modelo L-749, de maior capacidade de combustível e alcance. O Constellation 749 foi muito bem nas vendas: diversas empresas européias, a USAF e US Navy escolheram a versão, que foi o última desenvolvida a partir da célula básica do Constellation.

Nasce o Super Connie

No final dos anos 40, ocorreu o primeiro grande "boom" do transporte aéreo. Para atender a essa demanda, que exigia maior capacidade, velocidade e alcance, a Lockheed criou uma versão alongada do Constellation: o modelo L-1049 Super Constellation. Com 5 metros a mais no comprimento, capacidade máxima para 109 passageiros e novos motores Wright R-3350-956C18CB-1 de 2.700 Hp, o primeiro Super Constellation voou em outubro de 1950, entrando em serviço um ano mais tarde pela Eastern Airlines.

Sub-motorizado, necessitou de novos motores "turbo-compounds" Wright R-3350-927TC18DA TurboCyclone, de 3.250hp. Instalados, deram origem ao modelo L-1049C que voou em 17 de fevereiro de 1953, entrando em operação seis meses mais tarde com a KLM. Estes motores sempre apresentaram operação muito complexa, valendo ao Constellation o apelido de "Melhor tri-motor de todos os tempos".

Outras versões da série L-1049 surgiram: o modelo cargueiro L-1049D, e o L-1049E com maior peso operacional, bem como as duas versões mais famosas: o L-1049G (conhecido como "Super G") com motores Wright R-3350-972TC18DA-3 de 3.400hp e o L-1049H, com porta lateral de carga que permitia rápida conversão de cargueiro para passageiros. O último Super Constellation, um modelo H, foi entregue em 1958 para a Flying Tigers.
Surge o Starliner

Apesar do surgimento dos primeiros jatos, a Lockheed desenvolveu mais um Constellation. Batizado de modelo L-1649, ficou mais conhecido como Starliner. Com aumento de 79 cm na fuselagem, seu grande diferencial era uma nova asa, de maior envergadura, que permitia vôos de até 6.300 milhas náuticas. Enfrentando a concorrência dos primeiros jatos comercias de longo alcance, o Boeing 707 e o Douglas DC-8, teve sua produção encerrada com apenas 43 unidades construídas, trazendo grande prejuízo para a Lockheed, que não conseguiu sequer recuperar o investimento no desenvolvimento dessa versão. Este fracasso, somado aos problemas encontrados pelo turbohélice Electra, afastaram a empresa do mercado civil até a década de 70, quando só então surgiu o Lockheed Tristar.

Constellation no Brasil

Duas gerações de Constellation foram operadas por empresas brasileiras, ao longo de mais de 25 anos de carreira. Em março de 1946 a Panair do Brasil recebeu seus três primeiros L-049, originalmente entregues à Pan American e emprestados à sua subsidiária brasileira. Uma destas aeronaves, de prefixo PP-PCF (c/n 2049) "Bandeirante Manoel de Borba Gato" foi a primeira aeronave estrangeira a pousar no aeroporto londrino de Heathrow, ao término de um vôo experimental realizado em abril de 1946. Vôos regulares para Londres foram iniciados já naquele mês, e o tipo foi o principal equipamento utilizado na expansão internacional da empresa. A Panair também seria operadora do modelo L-149, intermediário entre o L-049 e o L-649, num total de 7 unidades. Os modelos L-649 e L-749 não tiveram operadores no Brasil.

Com o surgimento da versão L-1049E, a VARIG encomendou três destas aeronaves. Estas encomendas foram convertidas para a versão L-1049G, que entraram em operação em 2 de agosto de 1955 entre Rio de Janeiro e Nova York, com escalas em Belém, Port of Spain e Ciudad Trujillo (atual Santo Domingo). Em 1957, a empresa gaúcha recebeu mais três unidades, porém no mesmo ano perdeu o PP-VDA em acidente num vôo de traslado.

A Real (Redes Estaduais Aéreas Ltda.) adquiriu três modelos L-1049H, com os quais realizou serviços internacionais na América do Sul, além dos prestigiosos serviços entre o Brasil e Los Angeles, via Manaus, Bogotá, Panamá e Cidade do México. Com a chegada de uma quarta aeronave em 1960, esse vôo foi extendido para Tóquio, com escalas em Honolulu e Ilhas Wake. Com a incorporação da Real pela VARIG em 1961, estes aviões passaram a integrar a frota da pioneira.


O modelo que nunca existiu


No período em que a Real e a Varig operaram os Super Constellation, uma curiosa batalha de marketing foi travada. Como os Super H da Real eram equipados com tip-tanks, a empresa de Linneu Gomes pintou nestes tanques os dizeres "Super H". E o público pensava: ora, se o H era a letra seguinte ao G no alfabeto, este modelo com certeza seria uma aeronave mais moderna. A Varig, que operava a versão Super G sem os tip-tanks, nada podia fazer.

Então, chegaram os 3 últimos Super G da Varig, equipados com tip-tanks. A empresa gaúcha resolveu se vingar: pintou nesses tanques "Super Intercontinental", com grande destaque à letra "I". Quem olhasse de longe, lia apenas "Super I", fazendo seus Constellation parecerem mais modernos que os Super H da Real.

Com a falência da Panair decretada pelo governo em 1965, alguns de seus aviões foram vendidos. Entre eles, o PP-PDG, último Constellation em operação no Brasil pela empresa cargueira Arruda. No dia 29 de maio de 1972, ele se acidentou no território do Acre, caindo após decolar com combustível contaminado por água. Foi o triste final de uma longa e maravilhosa história em nosso país.

 

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