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JetBlue B618
O papel de editor do jetsite funcionava como um
acelerador de partículas dentro da minha cabeça: a
ansiedade de conhecer a tão falada jetBlue (jota
minúsculo e B maiúsculo) era total. Decantada em prosa e
verso, amada em Wall Street, imitada no Brasil e fora
dele, a empresa de Dave Neeleman vem revolucionando
conceitos. Tanto é assim que a jetBlue foi escolhida em
2002 como a "Melhor Companhia para Vôos Domésticos" e
"Melhor Classe Econômica" pelos leitores da revista
Condé Nast Traveller. Tudo isso numa empresa Low-cost...
e recém-nascida? O que é que ela teria de tão especial?
Eu tinha de descobrir e passar para você a experiência,
caro leitor do jetsite.
A experiência de voar jetBlue começou do conforto de
minha casa: através da internet, comprei minha passagem
e reservei meu assento em menos de 4 minutos
(cronometrados). Em seguida, no site da empresa,
reservei e paguei pelo hotel e aluguel de carro. Tempo
total da operação, incluindo a escolha de opções: 19
minutos. Ah! O preço da passagem? Pois não: para voar
num A320 estalando de novo, US$ 59,53 que, acrescido de
todas as taxas, deu US$ 72,50. Tudinho incluído.
É ou não é o caminho a seguir? Nada de emitir passagem,
perder tempo e ter dor de cabeça. Basta apresentar o
código de reserva e um documento com foto e você recebe
seu boarding pass. As simple as that. O modelo, copiado
aqui no Brasil pela Gol (exceto no preço, pois a
laranjinha hoje parece andar meio esquecida de que se
apresenta como uma empresa low-fare) é arrebatador.
Muito bem, vamos ao vôo. Devolvi o carro alugado na
Dollar (operação feita pelo site da jetBlue) no
aeroporto de Fort Lauderdale e fui para o Terminal 1, de
onde saem os vôos da empresa. O terminal é novíssimo e
muito funcional, bonito e arejado, nada a ver com a
maioria dos terminais decrépitos de Miami.
O vôo era o último do dia para New York, base de
operações da jetBlue. A entrada da empresa neste
mercado, antes limitada a dois vôos por dia, hoje soma
nada menos que 11 operações diárias (1.782 assentos!)
somente nesta rota, uma verdadeira ponte aérea. Tanto é
assim que o vôo B6 50 saiu apenas 20 minutos antes. O
nosso era o B6 (código IATA da jetBlue) de número 18.
Naquela noite, o B6 18 seria operado pelo Airbus
A320-200 de prefixo N536JB, um dos mais novos da
empresa, que não pára de crescer: só neste ano, serão
entregues mais 13 novos A320. Aliás, alguns analistas do
mercado estimam que por volta do ano 2010, a jetBlue
será a terceira maior empresa aérea norte-americana,
atrás apenas da Southwest e muito próxima da American!
Isso já indica a receptividade dos serviços da
companhia.
Bem, cheguei no terminal quase deserto e peguei uma
filinha pequena, que só não andou mais rápido porque os
funcionários do check-in estavam alegremente
conversando... entre sí. Pequeno deslize à parte, fui
tratado com simpatia e informalidade e fiz o check-in
rapidamente.
Em seguida, fui para o espetáculo pavoroso que é o de
passar pelo raio-x em vôos domésticos nos USA hoje em
dia. Que tal ser convidado a tirar os sapatos, óculos,
casaco e até o relógio na frente de estranhos? Um
cavalheiro na minha frente foi obrigado a tirar até o
cinto. E isso porque a guerra ainda não começou...
Fomos para o Gate C6 e o nosso "Bus" estava lá, bonito e
novinho em sua pintura modernosa. Os passageiros eram
uma mistura típica dos vôos com destino a New York: umas
50 raças e credos diferentes: de punks (sim, punks
moicanos) a judeus hassídicos, de brazucas a famílias "wasps"
inteiras.
Fomos chamados com simpatia e bom humor para o embarque
e eu, que estava sentado lá atrás poltrona 24A, fui o
primeiro a entrar no Airbus, o que me premitiu
fotografar o interior do avião e até mesmo a cabine de
comando. Fui lá para o fundão e fiquei analisando os
detalhes: as 162 poltronas de couro, pitch razoável, os
braços das poltronas levantados para agilizar o
embarque. Pequenos detalhes que aceleram bastante o
processo.
O relógio marcava 22:30, horário de nossa partida,
quando uma pequena confusão formou-se na parte dianteira
da cabine. Para resumir: uma família tentou
"contrabandear" seu cão de estimação numa mala de mão. O
animal, feliz por voar num Airbus A320 novinho, começou
a latir alegremente, no que foi imediatemente convocado
pelos comissários a voar no porão, "indelicadeza"
categoricamente recusada pela família, que alguns
minutos e vários impropérios depois desistiu da viagem.
Desembarcaram e as suas malas tiveram que ser retiradas
do porão da aeronave, o que acabou por atrasar a
partida.
O cmte. fez seu speech explicando o inusitado e mesmo
assim, pediu desculpas. Portas finalmente fechadas, o
vôo 18 da jetBlue começou com o trator dando o push-back
as 22:47. Tecnicamente, um vôo atrasado, pois saiu do
gate com mais de 15 minutos depois do horário publicado
de partida, 22:30. Três minutos depois o A320 taxiava
por quase toda a extensão da pista: o Terminal 1 fica ao
lado da cabeceira 27. Sem tráfego no solo ou nos céus,
entramos imediatamente na pista e decolamos da 09L as
22:57.
As luzes da cabine foram apagadas e permaneceram assim
até praticamente o pouso. É que a jetBlue é pioneira na
instalação de Direct TV a bordo. Cada passageiro tem um
monitor de TV no assento à sua frente, com 25 canais de
TV ao vivo. Assim, por incrível que pareça, encontrei um
capítulo da novela Esperança da TV Globo sendo exibido a
bordo. History Channel, Discovery Channel, CNN, ESPN,
ABC, NBC, CBS, Nickelodeon e outros menos cotados eram
alguns dos canais disponíveis.
Antes mesmo da aeronave decolar, os passageiros já
estavam ligados nas TVs. E a cabine, mantida às escuras
para melhorar a visualização, ganhou um colorido
especial, iluminada por 160 monitores de 6 polegadas.
Após estabilizarmos em nossa alitude de cruzeiro, a
tripulação começou com o serviço de bebidas e snacks. A
jetBlue não serve lanches nem refeições quentes, de
acordo com sua filosofia low-cost. Os passageiros
parecem não se importar muito, grudados nos assentos
assistindo televisão ao vivo.
Os comissários vão perguntando a cada um o que desejam
tomar e depois trazem as bebidas em bandejas, sem passar
com os trolleys pelo corredor. Depois, oferecem cinco
opções de snacks, entre doces e salgados: bolachas,
cookies ou nachos.
Com a programação de TV a toda, você efetivamente não vê
o vôo passar, a não ser que sintonize no canal que
informa o progresso da aeronave, indicando também
altitude e velocidade. As duas horas e doze minutos de
vôo naquela noite passaram literalmente voando: eram
01:09 da manhã quando o A320 da jetBlue completou o vôo
B6 18, unindo o Fort Lauderdale / Hollywood
International Airport ao John Fitzgerald Kennedy
International Airport, em New York. Nevava levemente lá
fora, com temperatura de 4ºC negativos. Mais um longo
dia para o N536JB terminava, e com ele a primeira
experência de voar na jetBlue.
Avaliação: notas vão de zero a dez.
1-Reserva: Nota 10.
O que mais você pode querer? Reservar um vôo doméstico
nos USA do conforto de seu próprio lar em 4 minutos...
Depois escolher o assento de sua preferência num mapa
que mostra os lugares disponíveis... Parece um
videogame!
2-Check-In: Nota 9.
Seria perfeito se não tivessem perdido tempo fazendo
piadinhas entre sí. E descoberto o cão contrabandeado...
3-Embarque: Nota 10.
Simpatia e informalidade, mas de forma bastante
organizada.
4-Assento: Nota 10.
De couro cinza, confortável e com uma TV na sua frente?
Nota 10, uai.
5-Entretenimento: Nota 10.
Viva a jetBlue, que investiu e acreditou num novo
padrão: foi a primeira no mundo a colocar TV ao vivo
para todos os passageiros.
6-Serviço dos comissários: Nota 10.
Simpáticos e eficientes. Uniformes bonitos, excelente
atitude.
7-Refeições: Nota 7.
Segue o padrão low-cost, mas dá 5 opções de snacks.
8-Bebidas: Nota 7.
Bebidas alcoólicas como whisky, cervejas, etc estão
disponíveis. Nada mau para uma empresa que diz não ter
serviço de bordo...
9-Necessaire: sem nota.
Não é distribuída.
10-Desembarque: Nota 7.
Avião cheio, malas demoraram um pouco para chegar à
esteira.
11-Pontualidade: Nota 10.
Apesar de sair atrasado, a chegada foi on-time. E, ao
final das contas, é isso que vale.
Nota final: 8,18
Comentário final: com a expectativa lá nas alturas, a
jetBlue não me decepcionou. Observa-se nos detalhes e no
espírito dos colaboradores da empresa um bom humor
típico de gente que faz o que gosta e trabalha numa
companhia que está "com tudo", crescendo e prosperando.
O modelo de empresa criado por Dave Neeleman é
claramente vencedor e começa a atrapalhar seriamente as
grandes empresas aéreas "já estabelecidas". É o caso da
US Airways, que dominava o mercado entre Fort Lauderdale
e New York, hoje perdido para a própria jetBlue.
Cabe aqui uma história que ilustra bem o anteriormente
dito. Conversando no mesmo dia do vôo com meu amigo e
spotter Jeff Johnson, ele me contou que naquela semana
fora despedido da US Airways. Então enviou seu currículo
à jetBlue, que estava contratando mecânicos como ele. Um
funcionário da jetBlue ligou, informando que iria ser
uma seleção difícil: para pouco mais de 200 vagas, a
jetBlue fora contactada por mais de 10.000 pretendentes.
Com este astral, com esta imagem no mercado e com as
dificuldades das concorrentes, fica mais fácil contratar
profissionais dispostos realmente a servir. Esta é a
jetBlue, uma empresa onde o futuro aponta para céus
azuis.
Gianfranco Beting