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Delta e NWA


A Delta Air Lines e a NWA vão voar juntas. Com a incorporação total do nome e marca NWA, a Delta transforma-se na maior companhia aérea do planeta. Os números por sí só ja valem notícia. A receita anual está estimada em mais de US$ 35 bilhões. Serão 390 cidades servidas em 67 países. Quase 90 mil funcionários e mil aeronaves, sem contar outras centenas nas regionais afiliadas. A nova gigante passa a ter hubs respeitáveis em Atlanta, Cincinnati, Detroit, Memphis, Minneapolis/St. Paul, New York, Salt Lake City, Amsterdam e Tokyo-Narita. Um colosso do ar.

No entanto, a notícia tem também o poder de eclipsar o verdadeiro fato por detrás desse casamento de interesses: o setor pede socorro, sufocado pelo insustentável preço dos combustíveis - que bateu em US$ 114 - aliado ao recente, e acelerado, declínio da demanda. Juntas na desgraça, Delta e NWA acharam por bem reunir forças antes de enfrentar a borrasca que se anuncia.

Os sinais da severidade da tormenta estão aí. Em quatro semanas, quatro empresas foram desta para a melhor: Oasis Hong Kong, Skybus, Aloha e Champion, em rápida sucessão bateram as botas, abatidas em pleno vôo pela sanha dos sheiks.

A fusão pode ser até o caminho mais curto para resolver os problemas das duas empresas. Mas está longe de ser um caminho florido. As associações de pilotos das duas empresas já se manifestaram frontalmente contra a fusão. Em operações como esta, os pilotos da empresa comprada (no caso, NWA) são preteridos na nova lista de senioridade, formada quando os dois times são misturados. Normalmente, vão para o fim da fila, atrás de todos os pilotos da empresa compradora, no caso a Delta. Isso significa perdas salariais significativas e leva a um justificável sentimento de revolta entre a tropa.

No Brasil, isso aconteceu recentemente com Gol e Varig. Os antigos e experientes pilotos da Pioneira estão tiriricas, espumando lá no fim da fila. É bom lembrar que o médico-chefe da American Airlines deu uma definição hilariante sobre a importância da senioridade na carreira dos pilotos. Para ele, todo piloto só tem três coisas na cabeça: salário, sexo e senioridade.

Mas voltando à América, esta fusão, de quebra, também resolve outro problema crônico do setor, que vai ficando cada vez mais agudo com a desaceleração econômica de Tio Sam: o excesso de oferta. Quadro que, a depeito desta fusão, é ainda preocupante. Tem companhia demais para passageiro de menos. A mega-fusão em parte resolve isso. A Delta e NWA racionalizam a oferta, aposentam os aviões mais velhos (os beberrões DC-9 da NWA são as primeiras vítimas) e adequam malhas no sentido de coordenar vôos, linhas, horários.

O outro efeito dessa fusão é indireto: obriga a concorrência a reagir. A fusão da Delta com a NWA vai obrigar outras empresas aéreas a tomarem o mesmo caminho. Elas vão ter que engolir o orgulho e buscar, na froma dessas traumátucas fusões, a panacéia para poder não apenas reduzir custos, como também enfrentar as nova mega-gigantes. De outra maneira as chances de sobreviver, sob estas novas regras do mercado norte-americano, ficam cada vez menores. O anúncio da Delta + NWA deve ser o catalisador dessa nova onda de consolidação no setor. O próximo casal formado já tem nome: a Continental e a United Airlines já vêm conversando há alguns meses.

"Certamente vai haver mais pressão para United e Continental procurarem uma união, frente à ameaça da fusão entre Delta e Northwest", afirmou Jim Feltman, consultor especializado em aviação. "É quase obrigatório, em vez de desejável", afirmou.

Enquanto a Delta ganha espaço, o presidente da United, Glenn Tilton, afirma que a consolidação não é a única saída para manter o setor manter a estabilidade.

"Enquanto a indústria vai se desenvolvendo, vamos tomar as medidas necessárias para fortalecer nossa competitividade global. Vamos participar de consolidações quando e somente se este caminho for a escolha que produza os benefícios certos para nossos empregados, clientes e parceiros", diz Tilton, em mensagem a seus desconfiados colaboradores.

Do lado da Continental, que está em melhor posição econômico-finaceira, a visão é a mesma: "Como dissemos há mais de um ano, preferimos nos manter independentes enquanto o cenário competitivo mantém-se igual", disse o presidente da Continental, Larry Kellner. "Porém, o cenário está mudando." Nenhuma das empresas, no entanto, confirmou as negociações de fusão.

As autoridades setoriais tudo observam, e bem de perto. Nos Estados Unidos, país sério, concentração de poder levanta as sobrancelhas de todas as organizações de direitos do consumidor. E é bom lembrar: esses grupos são organizados, têm poder, e não é pouco. Podem mesmo acabar colocando água no Jet A-1 de fusões como esta da Delta e NWA - ou de todas as outras pretendentes.

As fusões contam ainda com mais um fator complicador: as alianças entre empresas aéreas. Por força de cláusulas contratuais e participações acionárias, United e Continental estão neste momento juridicamente impedidas de prosseguir num plano de associação. A Northwest possui ações da Continental (e vice-versa. Ambas são parceiras de longa data e associadas à Skyteam. A United é fundadora da Star Alliance, daí o conflito.

Dessa maneira, a Continental pode ter que optar por explorar outras opções. Entre as candidatas, estão a Hawaiian ou Alaska. A United e a US Airways, parceiras na Star, poderiam mesmo retomar as conversas entre sí, embora ainda guardem ressentimentos pelas tentativas anteriores e fracassadas de matrimônio.

Por fim, a American Airlines observa o cenário de perto, do alto de sua posição de maior empresa aérea do mundo - ao menos por enquanto. A poderosAA companhia certamente não vai ficar parada, observando suas concorrentes subirem para o topo da lista, posição que ela ocupa e defende com garras de águia há quase uma década. Pode-se esperar de tudo da American, menos que ela placidamente aceite o segundo lugar. Afinal, este ponto é dogma na companhia, um dos legados deixados na administração de Robert "Darth Vader" Crandall. O executivo ensinava aos seus comandados que a American não entrava em mercado algum, em rota alguma, para ocupar outra posição que não fosse a liderança. Esse foco, essa ferocidade não se perderam. Estão aí, prontas para entrar em ação.

Vai ser divertido.

G. Beting

16/04/2008

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